Brasil e UE juntam forças por clima e etanol
Assis Moreira Jornal Valor
O Brasil e a União Européia (UE) juntaram forças ontem na proteção do clima e para criar um mercado internacional de biocombustível (etanol e diesel) sustentável, que assegure produção com padrões ambientais e sociais. Sob aplausos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reiterou na primeira conferência internacional de biocombustíveis, realizada em Bruxelas, que o produto deve ter um lugar central numa estratégia planetária de preservação do meio ambiente.
Para o presidente, o etanol e o biodiesel ajudarão a reduzir o fosso entre países ricos e pobres ao proporcionar que mais de 100 países passem a ser produtores, comparado a apenas 20 nações que hoje produzem petróleo, a principal commodity global.
"Vamos trabalhar com o Brasil no setor de biocombustível e em toda agenda em geral de proteção do clima", afirmou o presidente da Comissão Européia, José Durão Barroso. "Há alguns riscos associados ao produto e por isso foi muito importante ouvir o presidente Lula mostrar que está comprometido com biocombustíveis que sejam sustentáveis e bem aceitos do ponto de vista ambiental e social".
Um analista brasileiro observou que o Brasil e a UE estão na mesma linha, mas que o "timing" é que foi ruim, com jornais da Europa publicando a libertação de 1.106 "trabalhadores escravos" de um canavial no Pará.
A mensagem de Lula em Bruxelas foi de que os biocombustíveis sejam vistos globalmente. Insistiu que as pessoas querem sair da dependência em relação ao petróleo, mas com solução nacional. Os Estados Unidos resolveram produzir etanol a partir de milho, com subsídios que chegam a US$ 4,5 bilhões. Cada país está tentando encontrar uma saída nacional e é isso que cria o dilema entre alimentos e energia.
Para Marcos Jank, presidente da Unica, entidade da indústria de cana-de-açúcar em São Paulo, o presidente Lula está correto. "Abordar o produto globalmente, e não sob a ótica de seu produtor nacional, mostrará que as melhores plantas estão na zona tropical. Sempre haverá vantagem comparativa nos trópicos porque a cana-de-açúcar é melhor do que a milho e beterraba, e palma é melhor que a colza. Quando se puder fazer álcool de celulose, o Brasil vai usar o bagaço da cana."
Para criar o mercado mundial, é preciso definir padrões, as características básicas do biocombustível. As discussões, principalmente entre os países com mais produção e consumo - EUA, UE e Brasil - estão avançadas. "O que não pode acontecer é os EUA terem um padrão e a Europa outro", diz Jank. "Se a Europa aceitar 0,2% de água no álcool anidro e os EUA, 0,5%, essa diferença pode ser importante e pode não ter a commodity."
A questão sobre a certificação de como o etanol é produzido é mais complicada. Jank destaca que o grande problema do etanol nos Estados Unidos é tarifa. Os americanos não demonstram boa vontade em discutir com o Brasil para dar acesso ao produto. A Europa é diferente, pois precisa importar óleo vegetal e etanol. Ocorre que os europeus querem condicionar a importação com padrão ambientalmente correto. É onde entra sua própria noção de certificação, que poderá incluir questões como desmatamento, agroquímicos etc.
Em Bruxelas, o presidente Lula propôs que a certificação seja discutida globalmente. O Brasil quer estar no centro do debate e anunciou sua própria iniciativa, que será coordenada pelo Inmetro. "O setor da cana-de-açúcar não tem nenhum temor de discutir, o que não queremos é que sejam impostas como barreiras não tarifárias", afirmou Jank. "O grande risco é que seja criada uma certificação ambiental (na UE) para defender o produto deles. Hoje, não tem certificação para petróleo, mas querem para biocombustível, porque tem lobbies importantes."
Durante o encontro, o ministro de Comércio da Suécia, Sten Tolgfors, declarou-se "convencido" de que, para se criar o mercado global para biocombustíveis, os países devem desmantelar barreiras ao produto. E conclamou imediatamente a UE a dar exemplo, abolindo as tarifas na importação de produtos como o etanol. Ele destacou que o etanol produzido no Brasil custa a metade do etanol europeu, a partir de cana-de-açúcar que é mais eficiente na redução de emissões de gases.
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