Presidente brasileiro: 'O profeta do possível'
Gilles Lapouge*
Lula passou por Bruxelas para a conferência internacional sobre biocombustíveis.
O terreno lhe é favorável. Os europeus amam Lula. Ele é de esquerda, mas de uma esquerda pragmática, que soube proteger seu poderoso país contra os desvios da Venezuela, Bolívia... Além disso, é “uma pessoa confiável” e tem um sorriso magnífico.
Claro, as teorias políticas dão pouco valor ao físico dos líderes. É um erro. Basta lembrar de Kennedy ou Nixon para medir os efeitos divergentes que produzem, no campo político, o charme ou a fealdade.
E o que essa “pessoa confiável” propõe aos europeus? Os biocombustíveis. Fortalecido com o sucesso pioneiro do seu país, Lula quer convencer a União Européia, depois de Bush, a se lançar na revolução verde. Metade da aposta já está ganha. A União Européia já decidiu elevar sua produção de biocombustível de 10 milhões de toneladas, em 2006, para 21 milhões em 2016.
No entanto, na mesma proporção do sucesso do etanol, aumentam as resistências. Há duas críticas principais. A primeira é ecológica - o que é o cúmulo, já que a vocação do biocombustível é justamente poupar o planeta dos danos causados pelo petróleo. O Greenpeace insiste nos inconvenientes, invoca o desflorestamento, os pesticidas, os transgênicos.
Na Indonésia, esse imenso império florestal, o aumento das culturas de palmeira oleaginosa causa o desaparecimento das florestas. Ora, esse desflorestamento é a primeira causa do aquecimento, vindo antes mesmo da emissão de gás. A Indonésia queima, por hora, uma superfície de florestas equivalente a 300 campos de futebol.
A essa crítica clássica se acrescentam novas. O biocombustível comprometeria a alimentação humana. Nos Estados Unidos, 5 milhões de hectares suplementares de milho (a superfície da Suíça) foram semeados. Resultado: o preço da terra disparou. No ano passado, o aumento atingiu 35%. Na China, onde o milho se estende vertiginosamente, o preço da forragem para o gado aumentou 25% no ano passado. A tortilla mexicana dobrou de preço depois que os Estados Unidos multiplicaram suas refinarias movidas a milho.
As organizações internacionais advertem.
O Fundo das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) calcula em 9% o aumento das despesas com alimentos nos países em desenvolvimento. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a FAO, em 2016 os preços dos cereais serão 20% a 50% superiores aos atuais.
Os aumentos afetarão pouco os países ricos, mas o impacto será severo entre os mais pobres.
Peter Mandelson, comissário europeu do Comércio, aproveitou a conferência para pregar prudência. “Não se pode aceitar uma corrida aos biocombustíveis que seja insustentável para o meio ambiente nas zonas em desenvolvimento.”
São críticas duras, mas que não freiam o entusiasmo pelo biocombustível.
No conjunto, Lula já tem algumas aprovações. O jornal Libération, muito sensível à ecologia, está entusiasmado. Fala de Lula como um “profeta do possível”. E conclui seu editorial com estas palavras: “Pouco a pouco, os governos mais sensatos aderem a essas concepções equilibradas (as de Lula). Um eixo Europa/América Latina se forma. Uma boa notícia”.
*Gilles Lapouge é correspondente em Paris
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