segunda-feira, 16 de julho de 2007

G1 Entrevista Jaques Wagner, governador da Bahia

A Primeira dama e governador da Bahia na abertura do PAN


O estado da Bahia viveu, durante 30 anos, “com alguns intervalos”, sob um governo que impunha-se pelo medo e o constrangimento. Esta é a opinião do governador Jaques Wagner (PT), que assumiu o estado em janeiro deste ano rompendo a hegemonia de 16 anos do grupo político comandado pelo então PFL, atual DEM (Democratas).

Foto: Editoria de Arte

Para Wagner, foi durante esses 16 anos que oito empresas montaram e desenvolveram o esquema de fraude em licitações de obras públicas na Bahia que criaria ramificações em outros cinco estados, desmontado pela Polícia Federal nas operações Octopus e Navalha.

“Isso tudo aconteceu antes de a gente chegar aqui. Aliás, todo mundo sabia. Em qualquer restaurante onde tem empresários jantando, o pessoal sabe que havia um grupo que dominava as contas de prestação de serviço da Bahia”, disse ao G1.

Questionado por que a oposição não fez a denúncia, então, o governador não tergiversa: “O problema é que você tinha o Judiciário sob controle, uma boa parte da imprensa igualmente sob controle, uma Assembléia Legislativa que fazia ordem unida. Era o estado do medo. Várias pessoas, até de organizações sociais, preferiam não comprar briga”.

[O G1 procurou dois ex-governadores do grupo político ao qual Wagner se refere. Um deles, Paulo Souto, governou a Bahia entre 2003 e 2006 e entre 1995 e 1998. Atualmente, é presidente do DEM na Bahia. Ele disse que só comentaria a entrevista de Wagner após a publicação.

O senador César Borges (DEM-BA), governador entre 1999 e 2002, afirmou que Jaques Wagner não tem projeto para a Bahia e governa "olhando pelo retrovisor". Segundo ele, o estado cresceu e se tornou a sexta economia do país sob os governos do então PFL. Leia a reportagem.]


Confira abaixo os principais trechos da entrevista de Jaques Wagner, a 11ª da série com governadores ao G1.

G1 - Os professores da rede estadual finalizaram uma greve que durou 55 dias. Mas o Sindicato dos Trabalhadores em Educação disse que o inicio das aulas era mais uma resposta à sociedade que um acordo com a proposta do governo. Os estudantes ainda correm o risco de ficar sem aulas?
Jaques Wagner -
Não creio, acho que os professores baianos têm responsabilidade e creio que sabem que os 55 dias já criaram uma dificuldade muito grande.

Foto: Lúcio Távora / Agência A Tarde / AE
Agência Estado
O governador em seu gabinete em Salvador
(Fotos: Lúcio Távora / Agência A Tarde / AE)

G1 - Não foi possível chegar a um acordo sobre o aumento salarial dos professores?
Wagner -
Para primeiro ano de governo, recebendo o estado com todos os problemas, [o salário dos professores] é acima da inflação. Sinceramente, acho que [a paralisação] foi uma precipitação. Entendo o anseio dos professores, mas não se pode imaginar que em seis meses se corrijam problemas de 10, 20 anos.

G1 - O governo saiu desgastado?
Wagner -
Toda greve é um problema e é mal vista. Evidentemente, a população culpa todo mundo, professores e governo também, acha que o governo poderia ter feito alguma coisa para evitar, é normal. Política é isso mesmo, desgaste, recuperação, vivi muito isso ao lado do presidente Lula no seu primeiro mandato como ministro. Me preocupa, mas não me assusta.

G1 - A Bahia é o estado mais rico do Nordeste e o sexto PIB do país, mas tem o 22º IDH e a 15ª renda. Como é possível mudar isso?
Wagner -
Mudando a orientação no modo de governar. Esses números que você citou só confirmam minha tese. Recebi um estado que estava de costas para as questões sociais. É mesmo contraditório: como a sexta maior economia do país só consegue o 22º IDH? Essa é a herança – como não gosto de dizer “herança maldita”, mas é a herança perigosa, preocupante que recebi, fruto de uma visão de governos do PFL que se sucederam e governavam privilegiando grupos e esquecendo a maioria da população.

G1 – Como todo novo governo, o senhor conseguiu amealhar o apoio da maioria dos deputados na Assembléia e de muitos prefeitos, inclusive de alguns ligados ao ‘carlismo’ que o sr. derrotou nas urnas. Esse “inchaço” da sua base não causa distorções?
Wagner -
Evidentemente que é natural que qualquer governo quando chegue busque construir a sua maioria. Construímos uma maioria de 38 numa assembléia de 63, com deputados que muitas vezes militavam do lado de lá e, com nossa vitória, quiseram abraçar um novo momento.

Foto: Lúcio Távora / Agência A Tarde / AE

G1 - Como então o sr. diferencia o seu governo da tradição política que governou o estado por 16 anos?
Wagner -
Nós viemos de uma política de 16 anos que vinha constrangendo as pessoas. O método de governar do PFL era de intimidar, de subjugar prefeitos. Muita gente que estava lá, não estava lá por concordância, mas por necessidade de sobrevivência, ou porque tinha medo de ser perseguido etc. Está se vivendo um novo momento aqui, que é o fim de um ciclo claramente. Digo com tranqüilidade que a Bahia não será a mesma nem na política, nem na administração. Muitos esquemas e estruturas que estavam montadas não vão sobreviver porque viviam à sombra do estado. Essa forma de governar, para mim, já faliu. O PFL se manteve aqui constrangendo o Judiciário, que hoje tem autonomia, assim como a Assembléia Legislativa. Não acho que nenhuma hipótese vai conseguir retornar em qualquer futuro aquele modo de fazer política.

G1 - O sr. diria então que o chamado “carlismo” como forma de fazer política acabou?
Wagner -
Não uso esse termo. Gosto de chamar o "modo pefelista de governar". Na minha opinião, não tem nenhuma hipótese de ressuscitar, principalmente na política e na gestão. Não gosto de ficar no bate-boca dos adjetivos, prefiro pegar os números. O PFL governa aqui há 16 anos, na verdade há uns 30, com pequenos intervalos. Se você faz um balanço de 16 anos, qual é? É a sexta economia porque fizeram uso excessivo da guerra fiscal para trazer empresas pra cá, comprometendo inclusive as finanças do estado e também porque tem historia de industrialização que não começou com eles, mas com outros governantes. Mas se você pega IDH, renda per capita, saúde, educação, estradas...

Foto: Lúcio Távora / Agência A Tarde / AE
Operação Navalha

G1 - As investigações da Operação Navalha, da Polícia Federal, mostram que estava na Bahia a origem do esquema de fraudes em licitações públicas. Como se explica que um esquema com tantas ramificações funcionasse impune há tanto tempo?
Wagner -
Essa pergunta tem que ser feita aos governos anteriores. Essas empresas se instalaram, viveram e montaram esse esquema nesses 16 anos. A investigação veio pra cá porque havia empresas que vinham pra cá e iam falindo, mudando de nome, fraudando o fundo de garantia, o INSS e mesmo assim continuavam sobrevivendo no estado. Na Bahia, precisava pedir licença para se instalar como empresa. Isso mudou completamente. Já entreguei todos os contratos para o Ministério Público Estadual para a investigação prosseguir. Isso tudo aconteceu antes de a gente chegar aqui. Aliás, todo mundo sabia. Em qualquer restaurante onde têm empresários jantando, o pessoal sabe que havia um grupo que dominava as contas de prestação de serviço da Bahia.

G1 - E ninguém da oposição quis fazer essa denúncia antes?
Wagner -
O problema é que você tinha o Judiciário sob controle, uma boa parte da imprensa igualmente sob controle, uma Assembléia Legislativa que fazia ordem unida. Era o estado do medo. Várias pessoas, até de organizações sociais, preferiam não comprar briga. Era o jeito de governar, via contrangimento. Eu tenho a caneta, então digo: “Você não gosta de mim, não vai votar com o governador, então sua prefeitura não vai ter nada”.

Foto: Luiz Tito / Agência A Tarde / AE
Agência Estado
Jaques Wagner discursa durante feira agropecuária (Foto: Luiz Tito / Agência A Tarde / AE)

G1 - O foco inicial da investigação, segundo a PF, foi a liberação de R$ 11,5 milhões pelo Ministério das Cidades para a Prefeitura de Camaçari, que é governada por um prefeito do PT, por intermédio da Gautama...
Wagner -
Não foi isso que “estartou”, a historia é um pouco diferente. Eles vieram investigar oito empresas, por isso o nome da operação era Octopus. No meio dessa operação, houve o vazamento de informação, que se atribuiu a pessoas da própria Policia Federal - até por isso a mudança do nome para Navalha (de “Navalha na Carne”). Aí apareceu o empreiteiro Zuleido Veras, que estaria financiando a festa de posse de um delegado da PF. Daí a investigação sai das oito e vai para essa outra empreiteira, que fez negócios com Camaçari nos governos anteriores. No governo do prefeito [Luiz] Caetano – é bom lembrar que já tem dois anos e meio, portanto tempo suficiente - não tem nenhuma fatura executada por essa empreiteira.

G1 – O sr. foi citado no início das investigações da Operação Navalha de uma maneira até inusitada, por ter usado uma lancha do empresário Zuleido Veras num passeio...
Wagner -
É, mas isso para mim é uma matéria requentada. Eu passeei numa lancha, já dei minhas explicações, acho um besteirol esse negócio. Digo sempre que a gente tem que buscar causa e efeito nas coisas. A própria “Isto É” já publicou a carta resposta.

G1 - Mas não é estranho que uma pessoa, que é apontada pela PF como comandante de uma organização de fraudes, gravitasse tão próximo do governo?
Wagner -
Se você quer explorar tem todos os elementos aí, mas acho essa uma matéria requentada. Ele não gravita nada, não tem nenhum negócio nem interesse. A ministra Dilma esteve aqui e eu pedi a um amigo para alugar uma lancha e, em vez de ele alugar, ele tomou emprestada a essa pessoa, mas não tem nenhuma relação nem pessoal nem comercial.

Foto: Lúcio Távora / Agência A Tarde / AE

G1 - O senhor já criticou a disputa entre as tendências internas do PT. Será possível chegar a um consenso no congresso do partido em agosto? Que PT o senhor acha que sairá do encontro?
Wagner -
Sim. Tivemos problemas duros, graves, que nos fizeram sofrer muito, mas como toda crise produz momento de superação. Não sou de nenhuma tendência do PT, sou do grupo independente. Creio que a própria eleição de 2006 mostrou, para a tristeza dos adversários do PT, que mesmo a população nos cobrando a responsabilidade pelos erros cometidos, continua reconhecendo que o PT tem contribuições a dar à democracia brasileira.

G1 - O seu nome é sempre citado como um dos presidenciáveis do partido.
Wagner -
São meus inimigos [risos].

G1 – Mas a presidência está nos seus planos?
Wagner -
Só converso do governo da Bahia. Dizem que quem vive de passado ou só pensa no futuro, esquece de viver o presente.

G1 - A aliança preferencial do partido no ano que vem e em 2010 é com o PMDB?
Wagner -
Não. Está muito cedo ainda. Todo mundo tem que cumprir sua tarefa. O governo do presidente Lula tem que melhorar mais ainda as condições do país. Temos 2008 pela frente, ainda temos muito chão.

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