sexta-feira, 3 de agosto de 2007

20% das mulheres do Norte já abortaram

O Estado de São Paulo

No Acre e no Amapá, há 40 casos para cada cem em idade fértil

Simone Iwasso

O aborto inseguro - e as complicações à saúde da mulher decorrentes dele - reflete o perfil que a desigualdade social e econômica tem no Brasil: há o dobro de casos nas regiões mais carentes e ocorre com três vezes mais freqüência entre mulheres negras e pobres. A constatação aparece no estudo “Magnitude do Aborto no Brasil”, feito pela organização não-governamental internacional Ipas e pelo Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), com apoio da área técnica da Saúde da Mulher do Ministério da Saúde.

Usando uma metodologia internacional para estimativas de aborto, dados populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e registros do Sistema Único de Saúde (SUS), o estudo indica que, em 2005, foram feitos cerca de 1 milhão de abortos ilegais no País.

Pela estimativa, nas regiões Sul e Sudeste (com exceção do Rio), as taxas ficam abaixo de 20 abortos induzidos para cada cem mulheres de até 49 anos. Nos Estados do Norte e do Nordeste (tirando Rio Grande do Norte e Paraíba), os índices ficam acima de 21 abortos por cem mulheres. No Acre e no Amapá, chegam a até 40 abortos feitos ilegalmente para cada cem mulheres em idade fértil.

Quando o estudo analisa apenas a faixa de adolescentes entre 15 e 19 anos, as proporções se repetem, sendo maiores nos Estados mais pobres. O mesmo acontece quando se analisam as mortes provocadas por complicações do aborto feito em casa ou em clínicas clandestinas. Em Salvador, por exemplo, de acordo com dados do Ministério da Saúde, há mais de dez anos o aborto provocado aparece como a principal causa de mortalidade materna - no restante do País, está em terceiro lugar.

“Os dados mostram que a ocorrência e os riscos do aborto inseguro não se distribuem de maneira homogênea na população. Afeta as mulheres pobres, as mais vulneráveis, que acabam recorrendo a métodos caseiros para tentar interromper a gravidez”, afirma o médico Mário Monteiro, professor da Uerj e um dos responsáveis pela pesquisa.

INFORMAÇÃO E MÉTODO

Dois fatores importantes, segundo ele, são o maior nível de informação das mulheres das regiões mais desenvolvidas e um maior acesso a métodos contraceptivos. “No Brasil e na América Latina, os estudos indicam um aborto para cada quatro nascidos vivos. Nos países desenvolvidos, esse índice é de aproximadamente um para cada oito”, diz.

O tema do aborto voltou ao debate público neste ano desde que o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, se pronunciou sobre o tema, falando que ele pertencia à esfera da saúde pública. Temporão chegou a mencionar a realização de um plebiscito sobre o assunto.

De acordo com o Código Penal, o aborto é permitido em casos de estupro ou de gravidez que coloque em risco a vida da mulher. “É equivocado falar em quem é a favor ou quem é contra o aborto. O enfrentamento do problema deve ser feito por meio das políticas públicas, da saúde e da prevenção”, afirma o juiz José Henrique Torres, de Campinas.

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