Cidade limpa?
ANTONIO DONATO
A verdadeira cidade limpa exige consistente política ambiental, direção seguida no modelo de limpeza urbana da gestão passada
A MANUTENÇÃO, pela prefeitura paulistana, dos contratos de coleta de lixo e o arquivamento, pelo Conselho Superior do Ministério Público do Estado, da investigação que apurava eventual superfaturamento de preços na licitação que escolheu em 2004 as empresas que prestam esse serviço em regime de concessão na cidade comprovam que a gestão da prefeita Marta Suplicy à frente da administração municipal de São Paulo agiu no episódio com lisura e tendo em vista apenas o interesse público.
Não podemos, porém, deixar de enfatizar o caráter puramente político-eleitoral que envolveu o processo, já que o atual governo municipal tenta apresentar a manutenção dos contratos não como um reconhecimento à plena legalidade deles, mas como uma ação que estaria resultando em economia de recursos para os cofres públicos, o que não corresponde à natureza dos fatos. Senão, vejamos!
A citada redução de custos prevista no acordo feito agora entre a prefeitura e as duas empresas prestadoras do serviço, da ordem de 17,31% sobre um contrato de custo total de R$ 9,8 bilhões em 20 anos, foi justamente o índice sugerido pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), da USP, quando o órgão, na gestão do então prefeito e atual governador paulista, José Serra, contratou o órgão, sem licitação, a um custo de R$ 945 mil para recalcular os valores dos trabalhos de coleta.
Naquela oportunidade, a Fipe concluiu que os valores estavam todos corretos, mas que, se o início de determinados serviços previstos nos contratos fossem atrasados ou reduzidos, os pagamentos mensais poderiam ser 17,31% menores.
E quais seriam esses serviços não prestados à população paulistana dentro dos prazos contratuais previstos? Entre outros, a ampla implantação da coleta seletiva (que gera ganhos ambientais e produz trabalho e renda), a coleta em favelas e locais de difícil acesso (que, além do ganho ambiental, contribui com a geração de empregos formais em cada região), a construção de dois aterros sanitários (já que os atuais estão fechados) e de duas usinas de compostagem.
Resumindo, essa foi a "mágica" conjurada pela atual administração municipal: reduziu custos esticando prazos para a prestação de serviços essenciais à saúde pública da população, ou seja, a redução de investimentos na cidade é inversamente proporcional ao imenso prejuízo ambiental e social provocado.
A prefeitura levou exatos dois anos para finalmente adotar a sugestão que lhe foi dada pela Fipe em outubro de 2005, qual seja, acatar a legalidade dos contratos (reconhecida pelo Ministério Público) e atrasar a realização de serviços essenciais para reduzir o custo dos pagamentos mensais às companhias encarregadas do setor.
Só que essa demora acarretou também um ônus adicional para o município de R$ 139 milhões decorrentes das dívidas acumuladas com as empresas pela redução unilateral praticada pela administração paulistana desde 2005, cifra que será paga, conforme informações divulgadas pela imprensa a respeito do acordo fechado entre a prefeitura e as prestadoras, em dez prestações até o final da gestão do atual prefeito Gilberto Kassab.
É, portanto, imprescindível que, além da conduta correta adotada pela administração municipal petista que formalizou os contratos em questão, fique patente que o projeto que começou a ser implementado na área da limpeza urbana da cidade de São Paulo a partir de 2001 inaugurou um novo e moderno conceito desses serviços em termos de seu nível técnico e da democratização dos benefícios prestados à população como um todo em um dos maiores centros urbanos do mundo.
Modelo que, ao mesmo tempo, atende as demandas de serviços da cidade e contribui com aspectos sociais relevantes, como a geração de trabalho e renda. Tentar comprometer sua qualidade por meio de manobras puramente eleitoreiras é colocar em risco, em última instância, a saúde de uma população que o poder público tem a responsabilidade de preservar.
Uma verdadeira cidade limpa exige uma consistente política ambiental.
Essa foi a direção seguida na elaboração do modelo de limpeza urbana implantado na gestão passada. Mesmo tardio, o reconhecimento da transparência e da lisura do processo realizado por Marta Suplicy à frente da administração municipal de São Paulo acabou mostrando de que lado se encontrava o verdadeiro interesse público.
ANTONIO DONATO é vereador de São Paulo pelo PT. Foi secretário municipal das Subprefeituras de São Paulo (gestão Marta Suplicy).
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Um comentário:
Morei durante 35 anos numa casa no bairro de Pinheiros em São Paulo e há 10 anos mais ou menos, comprei uma lixeira que foi cimentada na frente do portão da minha casa e, por suposto, deveria ser usada só por mim. Era comum ver as vizinhas vindo à noitinha, sorrateiramente, colocar o lixo de suas casas na minha lixeira e cheguei à conclusão que elas sentiam vergonha pelo fato de perceberam que suas casas geravam lixo, pois tudo faziam para que o lixo fosse para a frente de outra residência. Nunca vi revolta tão grande e tão passional, como quando a Marta Suplicy instituiu o imposto sobre lixo e sempre pensava que a Marta, sem querer talvez, tinha colocado o dedo na ferida, pois as madames tinham afinal que reconhecer que a casa delas era geradora de lixo. A Marta, como sempre, sabia muito bem o que estava fazendo, mas a classe média de São Paulo não perdoou nunca esse fato. No meu caso, depois de muita reclamação, pararam de colocar o lixo delas em frente da minha casa. Mudei daquela casa faz um ano, minha irmã continua morando na casa de baixo, vou lá toda semana e pude comprovar com certo assombro, a vingança da vizinhança, pois agora a minha ex-lixeira virou realmente o depósito de lixo de todo quarteirão, ou melhor dizendo, pela quantidade de lixo ali colocado, de todo o bairro.
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