O caixa 2, o Nordeste e o conselho que não darei a FHC
Blog de Alon
Qual será, para a eleição de presidente em 2010, o efeito da crise desencadeada pela denúncia do Procurador Geral da República contra os envolvidos no caixa 2 do então candidato à reeleição pelo PSDB ao governo de Minas Gerais em 1998, o hoje senador Eduardo Azeredo (PSDB)? Muito provavelmente nenhum. Do mesmo modo que foi nulo na presidencial de 2006 o efeito da tempestade provocada pelas acusações de Roberto Jefferson em 2005, o "mensalão". Servirá, entretanto, para infindáveis duelos verbais, midiáticos e mercadológicos entre petistas e tucanos. Mas, pelo menos num aspecto a nova denúncia tem utilidade: ela oferece um novo "gancho" jornalístico para recolocar na agenda a "pauta ética". Aliás, a convenção tucana foi prenhe de discursos destinados a reanimar essa cambaleante agenda. Segundo o site do PSDB,
Ao transmitir o cargo de presidente do PSDB nesta sexta-feira, o senador Tasso Jereissati (CE) afirmou que a democracia e os valores éticos e morais da nação estão em risco. "Todo o trabalho de trazer a ética para vida pública, de colocar a democracia como valor fundamental da nação, está em risco. O governo Lula é a principal fonte de destruição desses valores", alertou. Para o tucano, a impunidade que marca a gestão petista passou à população a impressão de que "roubar é normal". "Nosso papel hoje é dizer não: corrupção não é normal, falta de ética não é normal. O coração de uma sociedade são seus valores éticos e morais. Temos de dizer um basta a essa crise", argumentou.
Clique aqui para ler a reportagem completa sobre a fala de Tasso no encontro tucano. O observador que não sofre de amnésia, porém, lembra-se de que poucas semanas atrás o então presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati, participava de uma tentativa de acordo com o governo Luiz Inácio Lula da Silva para prorrogar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). A CPMF, se prorrogada, dará ao governo federal cerca de R$120 bi até o fim deste mandato de Lula. Se o senador achasse mesmo que o governo Lula é "a principal fonte de destruição" dos "valores éticos e morais da nação" certamente nem cogitaria de dar ao presidente essa gordura orçamentária para gastar. Ou então o senador só chegou a essas conclusões sobre o governo Lula depois que micou o acordo com o Executivo petista. Mas Tasso Jereissati não está sozinho no nonsense. O novo presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), também bateu duro durante o evento tucano. Segundo o site do PSDB,
Guerra afirmou que o país precisa de governo transparente, "sem donos", "sem aloprados" e "sem montanhas de dinheiro". O tucano se referiu aos escândalos de corrupção na administração petista. "Lula esqueceu o Nordeste, os trabalhadores, o povo e se tornou instrumento do populismo e das elites", rechaçou.
Clique aqui para ler a reportagem completa. Chamou especialmente minha atenção a frase "Lula esqueceu o Nordeste". Por diversas razões. A mais vistosa delas é que Lula deu uma lavada no tucano Geraldo Alckmin ano passado em Pernambuco, estado de Guerra. Lembremos do resultado do segundo turno no estado:
Lula - 3.260.996 votos (78,5%)
Alckmin - 894.062 votos (21,5%)
No primeiro turno tinha sido assim:
Lula - 2.993.618 votos (70,9%)
Alckmin - 964.730 votos (22,8%)
Mas o eleitor sempre pode se enganar, não é? Com base nessa precaução, fui pesquisar um pouco para saber o que de fato se passa na região do país representada pelo novo presidente do PSDB. E encontrei o estudo Ambiente de negócios - região Nordesde (2007), da consultoria Deloitte. O texto é dirigido a potenciais investidores. Empresários, como o senador Sérgio Guerra. Vale a pena fazer o download. Diz o relatório que
As atividades consideradas tradicionais na região, como os setores de serviços e de turismo, além das indústrias têxtil, sucroalcooleira e de alimentos e bebidas, têm continuado a receber investimentos. Entretanto, outra realidade transforma a economia nordestina, tornando-a mais atrativa, seja pela clara diversidade industrial, como também pelo crescimento significativo da indústria petroquímica, do comércio de bens de consumo, das atividades de comércio exterior e das oportunidades de investimentos em áreas como a de biocombustíveis.
Diz também que
Vários fatores contribuíram para impulsionar a região nos últimos anos. O contexto macroeconômico estável, a proximidade de fontes de matérias-primas, a média salarial praticada e a disponibilidade de incentivos fiscais têm contribuído para a atração de investimentos estrangeiros e a migração de indústrias de outras regiões do País. Além disso, agrega-se a melhora na infra-estrutura portuária, estimulando a competitividade das empresas locais e facilitando o escoamento da produção para destinos internacionais.
O estudo traz um gráfico sobre o crescimento industrial nordestino em 2006 (clique na imagem para ampliar):
Vai bem Pernamuco no governo Lula. Aliás, a região toda vem ampliando fortemente na última década sua participação no produto industrial. Veja o gráfico abaixo, do mesmo estudo (clique para ampliar):
E tome otimismo:
(...) os indicadores econômicos refletem o crescente dinamismo da Região Nordeste na atração de novos investimentos. Segundo dados do Banco do Nordeste (BNB), os investimentos privados financiados pela instituição passaram de R$ 300 milhões em 2001 para mais de R$ 3 bilhões em 2006. No mesmo período, as liberações de recursos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a Região passaram de R$ 3,3 bilhões para R$ 4,8 bilhões. Somente no último ano, os financiamentos destinados para o Nordeste registraram um crescimento de 27%, superior ao incremento de 9% nas liberações totais da instituição de fomento. Entre os setores mais dinâmicos, destacam-se os de turismo, petroquímico, comércio de bens de consumo, construção civil e agroindústria, principalmente na fruticultura e na produção do biocombustível. Além dos investimentos privados, adiciona-se o investimento público previsto no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado pelo Governo Federal no início de 2007. O PAC, que prevê investimentos em infra-estrutura da ordem de R$ 503,9 bilhões em todo o Brasil, destinará R$ 80,4 bilhões ao Nordeste (aproximadamente 16%), que se apresenta como a segunda região mais beneficiada, após o Sudeste.
Outra informação interessante do relatório é que no governo Lula a região Nordeste deixou de ser importadora e passou a exportadora. Veja o gráfico abaixo (clique para ampliar):
E como esse impulso exportador se dá?
O incremento no valor das exportações regionais está relacionado, principalmente, à mudança no mix de produtos, com maior participação daqueles de valor agregado mais elevado. Os dados reforçam as mudanças estruturais ocorridas no perfil da produção industrial nos últimos anos, resultando no incremento da participação de produtos industrializados, tais como os dos setores automotivo, petroquímico, papel e celulose, siderúrgico, calçadista, têxtil e veículos. Destacam-se, também, os produtos básicos, como soja e fruticultura, com ênfase nas indústrias do agronegócio localizadas no Vale do São Francisco (Bahia e Pernambuco).
Não vou tomar mais tempo de vocês. Quem quiser, que leia o relatório. Este post começou com uma divagação sobre escândalos e seguiu mostrando o contraste brutal entre a realidade do Nordeste e como a descreve o novo presidente do PSDB. Mas não poderia deixar de comentar também a referência do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à falta de educação formal do sucessor. FHC jamais deveria fazer esse tipo de crítica a Lula. Pois o governo Lula é melhor do que foi o governo FHC. Se o sujeito com menos instrução faz o mesmo trabalho mais bem feito do que o sujeito com mais instrução, o mérito é do menos instruído, e não do mais instruído. Parece lógico. Quando FHC desdenha da educação formal de Lula, apenas reforça a idéia de que ele próprio, FHC, poderia ter feito algo mais quando esteve no Palácio do Planalto. O ex-presidente deveria achar outro mote para insuflar a galera dele. Alguém deveria dizer isso a FHC. Mas não serei eu. Pois eu confesso que ando cada vez menos propenso a gastar tempo com conversas de políticos que não encontram eco na realidade. Ou a desperdiçar energia com operações midiáticas para as quais, afinal, o povo não está nem aí.
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