sexta-feira, 16 de novembro de 2007

'Hoje, ter sensibilidade é visto como fraqueza'


Em seu novo filme, Into the Wild, Sean Penn conta a história do jovem que rompeu com tudo para encontrar sua identidade

Flávia Guerra - O Estado de São Paulo

Sean Penn apareceu de óculos escuros no encontro com jornalistas, logo após a primeira exibição de seu filme no festival de Roma. 'Ontem tomei vinho demais. Este festival é um perigo! Estou numa ressaca sem tamanho', explicou, arrancando risos de uma platéia que tentava entender se o ar blasé do enfant terrible de Hollywood era antipatia ou dor de cabeça. 'Estou feliz. Levei dez anos para realizar este filme.'

Penn faz a pose que lhe deu fama. Poucos sorrisos, mas muita vontade de falar de um tema que o persegue, de fato, há anos. 'Li o livro de uma só vez. Antes de dormir. Na manhã seguinte, acordei e pensei: 'Tenho de comprar os direitos agora.' Era uma história forte demais para se esquecer', contou o diretor sobre seu novo filme, Into the Wild , baseado no livro homônimo de Jon Krakauer (lançado no Brasil como Na Natureza Selvagem).

O livro conta a história real do jovem Christopher McCandles (Emile Hirsch), jovem americano de 22 anos que, em 1992, após se formar no segundo grau, parte em busca de experiências extremas no Alasca, um mundo selvagem, puro e revelador. Ele doa tudo que tem, despoja-se de todos os luxos, deixa seu carro pelo caminho e parte em busca de uma jornada sem volta. 'Ele transformou minha vida também. Passaram-se dez anos desde a primeira vez que eu li até o dia em que comecei a escrever o roteiro, mas, não precisei reler uma linha. A história ainda estava fresca na memória', conta Penn, para quem a saga de McCandles serve de inspiração para uma geração cada vez mais acomodada com o conforto que a sociedade moderna proporciona. 'A experiência foi tão forte que precisei percorrer os mesmos caminhos de McCandless, conhecer as pessoas que ele conheceu, passar um tempo com a família dele para entender que jovem ele foi.'

Mas sua escolha não foi extrema? 'Sim. Queria que meu filme ajudasse os jovens a entenderem que não é preciso partir em direção à morte para descobrir-se na vida; que, ou você vai lá fora buscar o que precisa ou vai tornar-se mais um parasita da sociedade. Precisamos romper com o sistema vigente e enxergar o mundo sob nova perspectiva que não a apregoada pelos que estão no comando', respondeu ele ao Estado. É por isso que você se engaja cada vez mais na política e já visitou países como a Venezuela e conheceu Hugo Chávez? 'Sim. Porque acredito que outro mundo é possível. Não vou ficar fazendo campanha, mas esta sociedade, este sistema que nos é imposto não tem feito muito de bom por nós.'

Vivemos em uma sociedade cada vez mais hipócrita, acredita ele. 'Não acho que McCandle tenha sido um visionário naif nem um cara perfeito. Ele tinha sensibilidade. Hoje isso é visto como ser fraco. Não quero que meus filhos sejam criados com esses valores. É preciso coragem para ser autêntico. Cada um deve mudar a si. E isso não é fácil.' A julgar pela decisão do júri de Roma, formado por jovens de países europeus, que deu a Into the Wild o prêmio de melhor filme da Seção Première, Penn não está semeando no deserto.

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