O jogo da governabilidade
por Luis Nassif É complicado esse jogo da mídia em torno de temas de seu interesse.
Os jornais de hoje repercutem a absolvição de Renan Calheiros, como repercutiram ontem. Só dão voz aos críticos, seja entre cientistas sociais ou público em geral. Na questão Renan estava em jogo muito mais ângulos do que a pessoa física do senador.
Tome-se o universo dos blogues. Há uma divisão entre os leitores que foram contra e os que defenderam a decisão. Tome-se o universo dos cientistas sociais. Tem pessoas de peso críticos da pressão da mídia sobre as instituições, assim como tem os intelectuais contra a decisão do Senado.
Mas essa diversidade não entra nos jornais. O “Estadão” de hoje dá a palavra a Elke Maravilha, João Gordo, o chef Alex Atala, o goleiro Rogério Ceni, todos contra o Senado. Como não há unanimidade na questão, é evidente que os que defenderam a decisão soberana do Senado não entraram, não ganharam a exposição pública da qual esses personagens tantos dependem para alavancar suas carreiras.
O jornal dá espaço até ao inacreditável Senador Romeu Tuma, paladino da moralidade, para que ele condene a decisão. Qualquer pessoa que tenha acompanhado minimamente a política nos últimos 25 anos, sabe quem é o senador Tuma e família. Ele declara: “Pessoas com pouca dor de consciência resolveram votar pela abstenção”. Os jornalistas mais antigos do “Estadão” devem estar às gargalhadas com o novo “varão de Plutarco” da política brasileira.
Duas páginas à frente, uma boa entrevista com o cientista político Cláudio Couto. Diz el
Esse é o tema central do caso Renan: a governabilidade.
Antes de ontem conversei com um dos grandes líderes tucanos. Ele é contra a derrubada da CPMF porque sabe que levaria a administração ao caos, é contra a estratégia do quanto pior, melhor. Uma coisa é propor uma reforma que, a médio prazo, substitua a CPMF por impostos melhores. Outra coisa é derrubar a CPMF sem ter nada no lugar. Ele condena colegas que apostam na pior via, mas é cauteloso para não perder apoio da mídia.
Nessa entrevista ao “Estadão”, Couto leva o tema para a questão central da governabilidade. É a novidade, de fato, é o tema sobre o qual a mídia não se pronuncia, como se o objetivo mesmo fosse Renan.
Mas, como todas as matérias têm que forçar a barra para o mesmo enfoque, como se a repetição de enfoques fosse ferramenta jornalística, o entrevistador sapeca a pergunta óbvia e recebe a resposta óbvia:
E a participação ativa do senador Aloizio Mercadante a favor da abstenção na votação do processo contra Renan? Como o sr. vê essa atitude do PT, partido que sempre defendeu a ética na política?
Essa bandeira da ética já foi perdida há muito tempo pelo partido. Basta lembrar do escândalo do mensalão, quando alguns dos principais líderes do partido vieram a público dizer que, em termos de recursos para campanhas, o PT fazia exatamente o mesmo que os demais partidos.
Uma pergunta óbvia, uma resposta óbvia, e fica garantida a manchete óbvia: “Bandeira da ética que o PT ostentava está perdida”. E o jornalismo virou a busca da obviedade nacional.
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