sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Vou trabalhar com uma velha amiga: a notícia

por Helena Chagas

Os políticos vão e vêm, os fatos políticos acontecem e “desacontecem”, eleições se sucedem, o poder muda de mãos. Nós, jornalistas, mudamos de área, função, endereço, emprego, espaço, enfim, trabalho. Somos viajantes, vivemos entre partidas e chegadas. E o que fica de cada uma dessas etapas do trabalho árduo e às vezes pouco compreendido da cobertura política? Ficam os amigos, o respeito profissional, o aprendizado e a consciência de ter tentado, a cada minuto de cada dia, fazer o melhor – às vezes conseguindo, às vezes não, sempre tentando.

Mas talvez o item mais importante da bagagem seja a tal da notícia, essa senhora meio estranha. Melhor falando, o amor pela notícia. Aquele gosto pelo novo que nos entusiasma a qualquer momento do dia ou da noite, faz correr a adrenalina faz esquecer o cansaço acumulado, as chateações, as frustrações, a hora de sair, a hora de chegar, a hora de comer, a família (desculpem, crianças!)...

O que é mesmo a notícia, hein? Em mais de 20 anos de profissão, até hoje não consegui encontrar uma definição satisfatória – nem acadêmica, nem técnica, nem nos domínios senso comum – para essa danada. Mas dá para reconhecer uma quando passa na frente. Não costumo me conter: quando vejo, já estou correndo atrás dela. Um problema sério essa fixação, da qual nem dez anos de análise freudiana conseguiram me livrar.

A notícia é tinhosa, teimosa, às vezes fugidia ou enganosa – em especial na política, essa área em que, na maior parte do tempo, estão todos querendo enganar a todos sobre tudo. A notícia às vezes é travesti: parece uma coisa, mas vai ver lá no íntimo e é outra. Em muitos casos – a maioria, infelizmente – é triste. Há quem chegue ao extremo de dizer que notícia boa não é notícia. Discordo. Mas concordo com os que dizem que a notícia, quando é só da gente, tem um sabor especial. Uma das maiores delícias da profissão é tascar um furo na concorrência. Vale qualquer sacrifício.

Bom, esse cerca-lourenço todo, que vocês devem estar estranhando, é porque ainda não tive coragem de contar. Mas lá vai: vou viajar de novo. E já estou morrendo de saudades.


O passado que não volta

Fazendo bem as contas, noves fora, esta foi a quarta vez em que trabalhei no Jornal de Brasília. Foi mais ou menos como voltar para casa. Entrei aqui como estagiária, aos 18 anos de idade, na editoria de Cidades, onde publiquei minha primeira matéria.Mas a promoção veio rápida demais. Uns dias depois, fui apresentada ao Congresso, onde precisavam de uma estagiária para percorrer plenário e comissões em busca de pautas e outras informações. Detestei. Ficava perdida nos corredores, confundia uma comissão com a outra, não via graça no que deputados e senadores falavam e faziam. Mas foi nos primeiros tempos de Congresso, ainda foca, que tive oportunidade de testemunhar momentos históricos. Por exemplo, a derrota da emenda Dante de Oliveira, que instituía as eleições diretas para presidente. Acompanhei essa votação lá de fora, junto com o povão que, naquela época, ainda ia esperançoso ao gramado em frente ao Congresso para pressionar os parlamentares. Também ali, protegida da chuva debaixo de uma imensa bandeira nacional trazida por manifestantes, que acompanhei a eleição de Tancredo Neves no colégio eleitoral. E, dois meses depois, a decepções do povo que dormira no gramado esperando uma posse e acordara sem o seu presidente.


O presente desafio

Na época em que comecei, as diretas para presidente eram um sonho, bem como a representação política para o Distrito Federal, que tinha um governador nomeado e não elegia representantes para o Legislativo. Ganhamos o direito de votar e achávamos que, com ele, tudo estaria resolvido. Pois é. Hoje a política anda triste, feia, cinzenta. A questão da corrupção vive um momento Tostines, aquele biscoito sobre o qual se tem uma dúvida crucial: vende mais porque é mais fresquinho ou é mais fresquinho porque vende mais? Temos mais corrupção no país e por isso ela está aparecendo tanto ou ela está aparecendo tanto porque estamos apurando muito mais do que antes? Não importa. A única certeza da política hoje é de que, com todas as idas e vindas, as decepções e a radicalização do ambiente, estamos andando para frente.



De volta para o futuro

Bom, como ia dizendo, vou viajar de novo. Foram quatro meses divertidíssimos por aqui, descomplicando a política. Mas chegou a hora de complicar um pouquinho mais a vida. É aquela história do apelo da novidade, do desafio, daquela adrenalinazinha que, quando a gente vê, está lá correndo nas veias. Saio para participar de um projeto com uma velha amiga: a notícia. Vou trabalhar na TV pública, que ainda será criada e onde acho que será possível produzir um jornalismo voltado para o cidadão e para o interesse público, sem assuntos proibidos e, sobretudo, mostrando com equilíbrio todos os lados de todas as questões para que a sociedade tenha elementos para formar sua própria opinião. Enfim, o bom jornalismo. Até a volta.

Coluna Descomplicando a Política de hoje no Jornal de Brasília
enviada por Helena Chagas

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