domingo, 9 de setembro de 2007

Lula quer plebiscito contra oposição na eleição de 2010

Brasília Online

KENNEDY ALENCAR
Colunista da Folha Online

Nas raras ocasiões em que fala da sucessão de 2010, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixa claro que considera ideal que haja apenas um candidato das forças governistas ao Palácio do Planalto. Engana-se quem pensa que isso seja conversa fiada.

Por quê? Lula acha que subir em dois ou três palanques de candidatos governistas poderá dissipar o cacife que ele espera ter ao final do governo. Se subir em apenas um palanque, poderá assumir mais abertamente a disputa política contra a oposição e tentar resolver a parada no primeiro turno. Resumindo: na visão presidencial, apenas um candidato teria mais chance de derrotar a oposição.

Lula acha que o ideal em 2010 é enfrentar um tucano, provavelmente o atual governador de São Paulo, José Serra, com apenas um candidato e gastando toda a força já de pronto. Sua idéia é forçar a realização de uma espécie de plebiscito a respeito dos seus oito anos de poder. Assim, ele também seria meio "candidato". E poderia, a exemplo de 2006, ressuscitar a comparação entre oito anos de petismo e outros oito de tucanato.

No cenário com um candidato do PT, Ciro Gomes (bloco PSB-PDT-PC do B) e um postulante do PMDB, haverá dificuldade para Lula subir em três palanques. Qual deles será o seu preferido? O PT aceitaria que ele apostasse mais fichas em Ciro?

Certamente, essa pulverização no primeiro turno, por mais que houvesse um acordo de cavalheiros para concentrar fogo na oposição, resultaria em escaramuças entre esses três hipotéticos postulantes.

Ciro, por exemplo, poderia se sentir mais liberado para fazer críticas ao governo. Caberia ao PT assumir a defesa mais explícita dos oito anos de governo de Lula.

Portanto, é equivocada a avaliação de que Lula deseja vários candidatos porque, assim, defenderia melhor o seu governo. É errada também a idéia de que o presidente deseja lançar um nome para perder e tentar voltar quatro ou cinco anos depois, a depender das regras eleitorais em vigor.

O presidente demonstra consciência de que um terceiro mandato lá para 2014 ou 2015 é um projeto de alto risco. Novas lideranças surgirão. As atuais se desgastarão.

O tucano Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, venceu duas eleições no primeiro turno (1994 e 1998). Em 2006, não chegou a 20% de intenções de voto nas pesquisas eleitorais.

Essas avaliações, realistas, levam Lula a insistir na tese de que a ampla coligação de partidos que apóia o seu governo deva lançar apenas um postulante.

O presidente sabe que é uma meta difícil. Conhece o PT. Compreende as dificuldades de o seu partido não concorrer diretamente à Presidência. Mesmo assim, vai jogar para unir forças. Se não der, deverá assumir atitude mais reservada. Lula quer fazer um jogo para ganhar, não apenas para constar.

Teme que deixar para juntar forças no segundo turno seja tarde demais. Crê que poderá encontrar apenas cacos para colar. Ciro tem pavio curto. O PT não perde a pose. E o PMDB não possui hoje um nome que mereça ser levado a sério. Um primeiro turno poderá deixar seqüelas irremediáveis para a segunda fase.

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Visão lulista

Lula acredita que uma chapa com Serra e o governador Aécio Neves (MG) na vice seria muito difícil de ser derrotada. Uma divisão das forças governistas só facilitaria eventual derrota.

A esperança de Lula é que ele sabe ser difícil que Aécio aceite coadjuvar Serra em 2010. Não acredita que o tucano mineiro consiga ganhar do colega paulista a cabeça de chapa. E acha que ficou tarde para o governador mineiro ingressar no PMDB.

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Getúlio em vida

Lula está confiante no registro histórico de sua administração. O pronunciamento em cadeia de rádio e TV da véspera de 7 de Setembro, no qual disse que estava nascendo um "novo Brasil", pode ter soado algo pretensioso. Mas é isso o que ele acha.

O presidente fala muito de Getúlio. Diz que o investimento destinado aos mais pobres também será a sua grande marca. Por isso, um auxiliar muito próximo considera provável que, uma vez fora da Presidência, Lula se dedique a curtir o figurino de "um Getúlio que viveu para além de agosto de 1954". A conferir.

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Seriíssimo

Muito grave a notícia de que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, ameaçou demitir o comandante do Exército, Enzo Martins Peri, caso o teor da nota do Alto Comando sobre o livro "Direito à Memória e à Verdade" fosse fora de tom. O livro foi o primeiro documento do governo federal a relatar atos cruéis da ditadura militar contra opositores do regime.

A nota do Alto Comando defendeu a ditadura. Não se envergonhou da afirmação de que o Exército de hoje é o mesmo que cometeu torturas, estupros, decapitações e execuções. Não aceitou discussão sobre a Lei da Anistia num momento histórico em que tribunais internacionais afirmam claramente que crimes contra os direitos humanos são imprescritíveis. E ainda disse que a pasta da Defesa era uma instância de coordenação, dando menor importância a Jobim.

Cabe indagar: qual era o teor da nota que os generais desistiram de divulgar? Seria uma ordem para um golpe militar? Um aviso para colocar os quartéis em alerta?

Ora, a nota foi muito dura.

Jobim fez de conta que não viu a afronta. Desmoralizou-se nesse episódio. O teor da nota foi mais do que suficiente para justificar a troca do comandante do Exército. Triste constatar: as Forças Armadas ainda resistem ao poder civil.

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Sonho meu

O promissor ministro da Defesa, aquele Jobim que afirmou que não permitiria reação ao livro sobre mortos e desaparecidos, não durou muito. Uma pena.

Após o chega para lá do Exército, voltou a ser aquele personagem de dimensão maior nas redações de Brasília do que na vida real. Falar em candidatura presidencial do peemedebista Jobim em 2010 é brincadeira.

Kennedy Alencar, 39, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos.

E-mail: kalencar@folhasp.com.br

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