quinta-feira, 5 de julho de 2007

A alternativa dos biocombustíveis

Por Luiz Inácio Lula da Silva

Hoje, em Bruxelas, abrirei, juntamente com o presidente da Comissão Européia, Durão Barroso, a Conferência Internacional sobre Biocombustíveis. Será uma excelente oportunidade de chamarmos a atenção da comunidade internacional para um tema prioritário da agenda global: as fontes alternativas de energia.

Multiplicam-se catástrofes naturais, conseqüência do aquecimento climático, assim como as incertezas em torno do fornecimento dos combustíveis fósseis. O mundo está confrontado com um duplo desafio: como alcançar a segurança energética sem causar desequilíbrios ambientais? Como reduzir padrões insustentáveis de consumo nos países desenvolvidos e, ao mesmo tempo, atender às aspirações ao bem-estar de povos em países pobres?

O programa brasileiro de biocombustíveis - testado e aprovado desde 30 anos - mostra que temos à nossa disposição uma resposta promissora para essa questão que envolve a segurança nacional e mesmo planetária.

Lula, Sócrates, Primeiro-Ministro de Portugal
e neste semestre presidente da União Européia e
Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia

Ao adicionar 25% de etanol derivado da cana-de-açúcar à gasolina ou utilizar álcool puro em carros "flex-fuel", reduzimos em 40% o consumo e a importação de combustíveis fósseis e deixamos de emitir, desde 2003, mais de 120 milhões de toneladas de gás carbônico.

O potencial das biomassas vai além da geração de energia limpa e renovável. A indústria do etanol já criou, diretamente, 1,5 milhão e, indiretamente, 4,5 milhões de postos de trabalho no Brasil. O programa do biodiesel, em fase inicial, já emprega mais de 250 mil pessoas, sobretudo pequenos agricultores em zonas semi-áridas deprimidas, gerando renda e ajudando a fixar a população à terra.

Esses programas reduzem migrações desordenadas e o conseqüente inchaço das grandes cidades e a marginalização urbana. Diminui a pressão de garimpeiros e agricultores sobre florestas nativas.

Contrariamente ao que alguns afirmam, os biocombustíveis não ameaçam a segurança alimentar, pois sua produção ocupa em torno de 2% das terras agriculturáveis do país. A expansão da cana tem contribuído para recuperar áreas de pastagem degradadas, de baixo ou nenhum potencial agrícola. Ocorre em regiões distantes da Amazônia, cujo solo e clima são inadequados para o cultivo da cana.

O programa de biocombustíveis se soma assim às ações governamentais em defesa da biodiversidade amazônica: repressão ao desmatamento e à grilagem de terras, além da criação de 20 milhões de hectares em unidades de conservação. Juntamente com a concessão de terras para a exploração sustentável de madeira, esse conjunto de medidas permitiu reduzir em mais de 50%, nos últimos três anos, as taxas de desmatamento e, portanto, de emissão de gases de efeito estufa.

Os biocombustíveis não ameaçam a segurança alimentar, sua produção ocupa em torno de 2% das terras agriculturáveis

Por meio de sistema nacional de certificação, vamos garantir que toda a cadeia de produção dos biocombustíveis no país respeite critérios ambientais, sociais e trabalhistas consagrados na legislação e exigidos pela sociedade.

Aí reside a grande força dos programas brasileiros de biocombustíveis: eles fazem parte de uma estratégia integrada de proteção ambiental, centrada no desenvolvimento sustentável do país em termos econômicos, sociais e ambientais.

Estou convencido de que os biocombustíveis devem ocupar lugar central em uma estratégia planetária de preservação do meio ambiente. Por isso, o Brasil defende esforço concertado para difundir essa revolução das biomassas. Acordos que assinamos com Estados Unidos e que estamos estabelecendo com países europeus prevêem a implantação de projetos triangulares na América Central, Caribe e África unindo tecnologia brasileira a condições climáticas e de solo favoráveis nessas regiões.

Todos sairemos ganhando. Países em desenvolvimento gerarão empregos e renda para populações marginalizadas, e divisas para dinamizar suas economias. Países desenvolvidos poderão acessar fontes de energia limpas a preço competitivo, ao invés de investir em custosas inovações para tornar menos poluentes os combustíveis convencionais.

Nada disso diminui a responsabilidade dos países desenvolvidos de adotar sérias normas de controle de emissões. Não diminuirá tampouco a disposição de países em desenvolvimento em implementar políticas de redução de emissões, apoiadas por um efetivo fluxo internacional de recursos e tecnologia. É esse o sentido da proposta brasileira de incentivos aos países em desenvolvimento que desacelerarem o desmatamento.

A resposta à ameaça do aquecimento global não está, portanto, em restringir o acesso de populações pobres a padrões mínimos de bem-estar. Não é necessário forçar os países em desenvolvimento a uma escolha injusta: reduzir seu ritmo de crescimento ou adotar novas tecnologias altamente onerosas.

Ao mesmo tempo, queremos desenvolver a próxima geração desses combustíveis, que poderá ser extraída de praticamente qualquer dejeto orgânico, em qualquer parte do mundo. E será a base de toda uma alternativa orgânica à petroquímica.

Além de vultosos recursos, esses avanços requererão tempo. E tempo é o que os países mais pobres - e nosso planeta - não têm. Urge implementar políticas que ajudem a garantir que a humanidade prosperará como um todo, sem deixar ninguém para trás, nem hipotecar o futuro das novas gerações.

Essa é a mensagem que levo à Conferência de Bruxelas: estão ao nosso alcance experiências amplamente testadas e comprovadas para começarmos a responder a um desafio que se avoluma a cada dia. Por essa razão, o Brasil está organizando, em 2008, uma Conferência Mundial sobre Biocombustíveis. Juntos, poderemos construir uma estratégia verdadeiramente global, justa e duradoura.

Luiz Inácio Lula da Silva é presidente da República.

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