Dízimo periódico
Dora Kramer
O assessor especial da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, considera “ridículas” as reações contrárias ao pagamento de dízimos ao PT por parte de seus filiados ocupantes de cargos no governo.
“Eu dou o meu dinheiro para quem eu quiser e dou muito alegremente o meu dinheiro ao meu partido”, disse ele na semana passada, quando o presidente Luiz Inácio da Silva criou 626 novos cargos em comissão e deu aumentos de até 139,7% aos agora 22.189 funcionários ocupantes dos postos disponíveis para nomeação política na administração federal.
O assessor tem todo o direito de usar o adjetivo que quiser a respeito de quem e do que bem entender. Só não tem é a prerrogativa de apregoar o confronto a uma ação já considerada ilegal pelo Tribunal Superior Eleitoral e ainda pendente de julgamento sobre a punição a ser imposta à entidade autora da cobrança.
Aliás, nem ele nem ninguém pode dar-se ao desfrute de sair por aí reivindicando o direito de infringir a lei e desrespeitar a Justiça impunemente.
Mas o gesto soa degenerado quando parte de um alto funcionário da confiança direta do presidente da República, dirigente de um partido que está no poder e encarregado da interlocução em diversas questões de interesse do País no âmbito internacional.
Ou o assessor desconhece as leis ou as ignora.
Está escrito no artigo 31 da Lei 9.096/95, a chamada Lei dos Partidos: “É vedado ao partido receber direta, ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de autoridade ou órgãos públicos, autarquias, empresas públicas ou concessionárias de serviços públicos.”
A exceção é a dotação destinada ao Fundo Partidário, distribuído a todas as agremiações. Fora isso não pode haver dinheiro público nos cofres dos partidos.
Com base nessa lei, em junho de 2005 o TSE decidiu, por unanimidade, responder a uma consulta feita pelo então deputado Eduardo Paes, do PSDB, confirmando que a cobrança de dízimo é proibida e, além disso, contraria resolução da Justiça Eleitoral que estabelece que o servidor precisa ter plena disponibilidade sobre sua remuneração.
O assessor poderia, confrontado com essa decisão, argumentar que os petistas contribuintes reservam ao partido recursos originários de outras fontes que não seus salários recebidos no governo.
Poderia, mas não seria objeto de crédito. E não porque o PT apresentou um crescimento de 545% na arrecadação proveniente de dízimos nos últimos quatro anos. Mas porque ele mesmo, Marco Aurélio Garcia confirmou a origem dos recursos: “Se o cargo comissionado é do partido, o militante tem que contribuir”, disse, em reação às reclamações.
Nada contra Marco Aurélio Garcia doar “muito alegremente” seu dinheiro ao partido. Mas, segundo a lei, só não pode fazê-lo com o dinheiro do contribuinte. Leia a integra da coluna de Dora Kramer no jornal O Estado de São Paulo (para assinantes)
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