Guerra de teles e TVs trava setor eletroeletrônico
Valdo Cruz
A guerra comercial no mundo das telecomunicações tem gerado prejuízos econômicos aos fabricantes de equipamentos para o setor. Diante da indecisão sobre o futuro do setor de comunicações no país, indústrias eletroeletrônicas diminuíram o ritmo de investimentos no país, já que não há uma firmeza nas encomendas de equipamentos.
Diretor da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica), Aluizio Birro lembra que os investimentos das indústrias fabricantes de equipamentos para o setor de telecomunicações chegaram a atingir R$ 24 bilhões em 2001, mas devem fechar esse ano em R$ 12 bilhões, mesmo número registrado no ano passado.
Birro sabe que voltar aos R$ 24 bi de 2001 não é fácil, já que naquele ano o mercado estava aquecido por causa do cumprimento das metas de universalização pelas teles. Acredita, porém, que se fossem destravadas algumas pendências o ritmo de investimento poderia melhorar. Ele lembra que em 2005 as inversões de capital no setor foram de R$ 14 bilhões.
Diretor da Nokia/Siemens Network, Birro diz que o setor já agradeceria e muito se a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) acelerasse a licitação da telefonia celular de terceira geração (3G) e buscasse solucionar a questão judicial que travou o Wimax (internet de banda larga sem fio). Essas duas áreas já poderiam aquecer novamente o mercado de equipamentos.
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Congresso e a guerra "teles versus TVs"
A preocupação com o travamento do setor não está apenas na indústria eletroeletrônica. Está também na agenda da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, que decidiu assumir o debate sobre a convergência tecnológica no país. Presidente da Comissão, o deputado Júlio Semeghini (PSDB-SP) diz que há toda uma remodelagem da legislação do setor a ser feita, que vai tanto democratizar mais as comunicações no país como impulsionar a economia.
"A legislação atual caducou, precisa ser refeita. Não trata de vários temas, como banda larga, além de criar distorções como proibir capital estrangeiro na TV a cabo e não fazer restrições na TV paga por satélite", diz o deputado Semeghini.
A Comissão de Ciência e Tecnologia quer aprovar até o final do ano uma alteração geral na legislação do setor de telecomunicações e regulamentar a convergência tecnológica no país --transmissão de voz, vídeo e dados por um único sistema, o chamado triple play.
As teles protestam contra a situação atual, que beneficiaria a Net, controlada pela Globo e Telmex, o grupo mexicano do empresário Carlos Slim. Segundo as empresas de telefonia, hoje só a Net tem condições de ofertar o triple play, que tende a ser o grande negócio do setor, principalmente com a entrada em operação da TV digital no país.
A missão da comissão não será nada fácil. Terá de fechar um acordo entre teles e TVs, que acionaram seus lobbies para defender seus interesses. As emissoras de televisão, por exemplo, encabeçadas pela Globo, querem evitar a concorrência das teles no sistema de TV a cabo no país, receosas com perda de faturamento no bolo publicitário.
Essa é apenas uma das pontas da guerra comercial. Aprovada a autorização para que as teles entrem na TV a cabo, várias outras disputas entrarão em cena. Uma delas é definir se as emissoras de televisão serão obrigadas a vender seu conteúdo para qualquer empresa de TV a cabo.
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A proposta de paz
Em agosto, o relator do projeto de convergência tecnológica, Jorge Bittar (PT-RJ), pretende apresentar seu relatório. Funcionará como uma proposta de paz no setor de telecomunicações. Vai criar o "Serviço de Comunicação por Acesso Condicionado" (TV por assinatura, por exemplo).
Abaixo, as principais idéias do deputado sobre como deveria ficar cada etapa desse tipo de serviço:
1) Produção de conteúdo nacional: Seria restrito a empresas com controle de capital brasileiro, podendo haver participação minoritária de capital estrangeiro (entre 30% e 49%).
2) Programação de TVs pagas: Idéia é que seja restrito a empresa com controle brasileiro, mas pode ser negociado o comando de estrangeiros. O programador, porém, terá de seguir regras estabelecendo cotas de exibição de programas nacionais, inclusive por faixas de horário.
3) Distribuição de programação de TVs pagas: Seria liberado para capital estrangeiro a operação de TV a cabo, o que beneficiaria as empresas de telecomunicações, hoje proibidas de atuar no setor. Elas ficariam ainda livres para atuar em TV paga em qualquer tecnologia.
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Teles versus teles
Na guerra comercial das telecomunicações, outra batalha é sobre o mercado das concessionárias de telefonia. Há uma tendência mundial de concentração do setor nas mãos de poucas empresas. É assim nos Estados Unidos e na Europa. O Brasil caminha na mesma direção. Dois grupos fortíssimos estão atuando hoje no país: Telefônica (espanhol) e Telmex (mexicano, que controla a Embratel). Além da TIM (italiano), Brasil Telecom e Telemar (Oi). Os dois últimos têm como acionistas os grandes fundos de pensão das estatais brasileiras e, a depender da vontade do governo, devem se fundir para formar uma grande tele brasileira.
O ministro Hélio Costa (Comunicações) defende abertamente a formação de uma grande empresa brasileira, com a fusão da Brasil Telecom e Telemar, para se contrapor ao avanço da Telefônica e da Telmex.
No Congresso, posição semelhante é partilhada por parlamentares governistas e da oposição. Envolvidos na renovação da legislação do setor, os deputados Júlio Semeghini (PSDB-SP) e Paulo Bornhausen (DEM-SC) são favoráveis à criação da nova tele.
O tucano apóia a criação de uma regra de salvaguarda para que essa nova empresa não seja, logo em seguida, vendida para um grupo estrangeiro. Proposta defendida internamente no governo, para evitar que a nova empresa caia, num futuro próximo, nas mãos de uma empresa estrangeira, como a Telmex.
Paulo Bornhausen diz que essa nova tele brasileira equilibraria o mercado nacional e evitaria a formação de um duopólio estrangeiro no setor, o que seria "péssimo". O governo, contudo, já foi procurado pela Portugal Telecom, interessada em participar do negócio. Foi informada de que seria bem-vinda, desde que não fosse majoritária no controle.
Essa guerra está só no começo e promete. É bom acompanhar.
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