Pouco importa a cor do gato, a condição que cace o rato
Alimentando a reflexão
O artigo a seguir foi publicado pela agência Carta Maior em janeiro de 2007.
Na semana passada o Prefeito Gilberto Kassab e o governador José Serra inauguraram o primeiro CEU da atual gestão. Outras inaugurações estão previstas para os próximos meses. Ver também Só falta agora eles falarem bem...
"CEU tucano" fracassa e Kassab aposta em "CEU petista"
Após só 3 Escolas Municipais Integradas, o 'CEU tucano', terem sido inauguradas em dois anos, gestão do prefeito Gilberto Kassab em São Paulo reajusta modelo e o aproxima ao CEU da gestão anterior, de Marta Suplicy.
Maurício Reimberg – Carta Maior
SÃO PAULO - Mesmo sem ter inaugurado até agora nenhuma nova unidade do CEU (Centro Educacional Unificado), criado pela gestão de Marta Suplicy (2001-2004), o governo do prefeito Gilberto Kassab (PFL) decidiu assimilar definitivamente a principal plataforma política de sua antecessora. O atual prefeito planeja a construção de 15 novas unidades, e oito delas já estão em obras. De acordo com a promessa da prefeitura, quatro começaram a funcionar já neste ano. Politicamente, Kassab tenta avançar na periferia da capital paulista, onde se localizam tradicionais redutos eleitorais da petista.
“Eles adotaram isso (construção de novas unidades) porque foram pressionados pela população, que foi organizada pela base para fazer o controle das políticas públicas”, justifica Cida Pérez, ex-secretária municipal de educação no período Marta Suplicy. “O discurso é de continuidade, mas na prática modificaram o projeto arquitetônico. Houve diminuição do espaço físico e das atividades culturais, tanto para a comunidade escolar como para a população da área educacional. O governo não tem nenhum projeto pedagógico novo. Quando o prefeito foi discursar na Câmara, eram todas as nossas idéias”, diz.
A atual administração modificou alguns termos do projeto original para enquadrá-los nos moldes da agenda política pefelista. Os novos CEUs serão horizontais para evitar elevadores, que aumentam os gastos com manutenção, e terão apenas duas piscinas em vez das três do antigo projeto. O governo alega que a construção das cinco próximas unidades consumiu um orçamento de R$ 100 milhões, o que representaria uma economia de 15% em relação à média do período Marta Suplicy.
Em uma estratégia paralela à retomada dos CEUs, com o mesmo intuito de fortalecer a presença na periferia de São Paulo, Kassab cunhou o termo “pós-escola” para designar os locais onde gostaria de fomentar aulas de esportes, informática, idiomas e atividades culturais. Como a maioria dos 247 clubes da prefeitura estão em situação precária, o governo aposta na busca de recursos junto à iniciativa privada. A prefeitura descarta a hipótese de esvaziamento dos CEUs com a entrada em vigor dos “clubesc”.
É uma movimentação política distinta daquela prevista pelo então prefeito José Serra (PSDB), que havia anunciado em 2005 uma versão mais barata dos CEUs, as EMIs (Escolas Municipais Integradas). Conhecido como CEU tucano, custaria R$ 100 mil, enquanto um CEU tradicional demanda R$ 20 milhões. O projeto previa a união de terrenos de clubes e de escolas através da “derrubada de um muro”, para que a maioria dos alunos recebesse ensino integral. O projeto, no entanto, está paralisado. Apenas três EMIs foram inauguradas até agora: Cambuci, Mooca e Tatuapé.
Participação popular
Lançado em 2001, o CEU é parte de um projeto político-pedagógico elaborado a partir de um estudo sobre as chamadas “zonas de exclusão social”, identificadas na periferia da capital paulista. Cada CEU tem três unidades educacionais: Centro de Educação Infantil para bebês e crianças de zero a três anos, Escola Municipal de Educação Infantil para as de quatro a seis anos e Escola Municipal de Educação Fundamental, entre sete e quatorze. A novidade está na oferta de espaços e equipamentos sociais, não só aos alunos, mas a toda população da região.
“Não dá para comparar as novas unidades com o projeto original. O prédio e as metragens são diferentes. Eles diminuíram o tamanho do teatro, da piscina. Embora a tônica do CEU fosse a educação, partilhávamos a gestão com a cultura e o esporte. O ponto positivo é que a construção está sendo feita nos mesmos lugares apontados pelo Plano Diretor, que mapeou as regiões com falta de acesso à cultura, desemprego e problemas de demanda não atendida pelo poder público”, diz Pérez.
O projeto original previa um limite máximo de 35 alunos por sala. No CEU São Mateus, há turmas que abrigam até 43 alunos. Neste ano, as vagas para o primeiro ano do ensino fundamental não serão abertas em São Mateus, por “falta de espaço físico”. As turmas realizavam rodízio entre as salas para abrigar todas as séries. Em outras unidades, há reclamações sobre o sucateamento das estruturas. No CEU Tremembé, a piscina foi retirada do projeto. No CEU São Rafael, ela ficou coberta por um entulho durante todo o semestre passado, e permanece desativada.
Outra mudança perceptível é a forma de relacionamento entre os conselhos gestores e a população. Cada unidade conta com um conselho gestor formado por membros do CEU, das escolas do entorno e da comunidade. O gestor é um cargo de confiança do prefeito e, no período Kassab, tem centralizado a organização das demandas. Isso dificulta, de acordo com os professores, a construção de uma relação pedagógica consistente entre as três unidades que compõe cada CEU.
“A divulgação das atividades para a comunidade não existe. Quando os gestores precisam de público, ligam para as escolas solicitando a presença dos alunos, para assistir peças de teatro, por exemplo. Recusamos, pois só há mobilização quando a peça tem função pedagógica. Algumas escolas da região comparecem. Outras, que se localizam longe da unidade, não têm como pagar o transporte dos alunos”, denuncia uma professora do CEU São Rafael. “Do ponto de vista de decidir sobre os rumos dos projetos, a comunidade não tem mais influência sobre os conselhos gestores”, diz uma professora de ensino fundamental do CEU São Mateus.
Desde a etapa final de implementação no governo Marta, o principal desafio do CEU é se consolidar como um pólo de inovação de experiências educacionais, conforme previsto no projeto original. “As idéias pedagógicas em si não são novas. Mas o grande mérito do projeto está no fato de ter criado um centro com saberes locais da comunidade, aliado às várias linguagens educacionais formais, e agregado parte da cultura e do esporte”, afirma Pérez. Procurado pela Carta Maior, o secretário municipal de Educação, Alexandre Schneider, não atendeu à solicitação de uma entrevista até o fechamento da reportagem.
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