É novamente a economia, estúpido
UOL teve a boa iniciativa de traduzir o artigo que reproduzi do Financial Times neste blog na terça-feira, em inglês. Graças a coluna do sempre antenado Nelson de Sá, TODA MÍDIA, na Folha de hoje, fiquei sabendo da tradução e estou postando ela aqui. Para quem quiser a versão em inglês é só clicar no link embaixo. No TODA MÍDIA têm outros links para a campanha nos EUA.
Terca-feira, 29/01/2008 - 19:45
Back to ‘the economy, stupid’: How a slowdown will influence America’s presidential contest
Este artigo vale a pena, apesar de cumprido e só acessível a quem lê inglês. Ele permite acompanhar a evolução do processo eleitoral norte-americano e sua relação com o impacto da crise econômica na população do pais. Ele reforça minha convicção que um presidente democrata será eleito em novembro, mas muito dependerá da mensagem sobre a crise. Por enquanto, se como mostra o artigo, os candidatos Republicanos estão fora da realidade, os principais candidatos democratas permanecem com posições vagas. Os Estados-Unidos vão precisar muito mais que generalidades e os eleitores estarão muito sensíveis aos efeitos da crise. LF
By Edward Luce
Toda Mídia
Nelson de Sá
É a economia, de novo
No capítulo de ontem, por TVs e sites americanos, europeus, brasileiros, saíram os quase figurantes John Edwards e Rudolph Giuliani, após nova derrota.
Ao fundo, como na análise “Retorna “é a economia, estúpido’”, do “Financial Times”, traduzida no UOL, vai se estabelecendo que a crise deve definir a eleição. O texto, ironizando o republicano John McCain por admitir que “economia não é algo que eu entenda tão bem quanto deveria”, arrisca que a desaceleração vai eleger um democrata. Outro texto, de um professor de Berkeley, diz que a classe média “não dá mais conta”, já exauriu os meios com que contornava os problemas econômicos no país, e olha “ansiosa” aos candidatos.
30/01/2008
Como a desaceleração econômica influenciará a disputa presidencial americana
De Edward Luce, do Financial Times
A questão da economia não é algo que entendi tão bem quanto deveria - John McCain, pré-candidato presidencial republicano.
Em muitos ciclos eleitorais, a observação recente do senador McCain poderia passar despercebida. Mas em um ano eleitoral em que a maior parte dos americanos acredita que já está em recessão, ele foi aconselhado prontamente a ler o livro de Alan Greenspan, ex-diretor do Federal Reserve, que o senador dissera estar carregando.
Por um longo tempo assumiu-se que a eleição presidencial de 2008 seria dominada pelo Iraque, medo do terrorismo, restauração da posição dos EUA no mundo e outras questões de política externa. Mas então a crise das hipotecas começou a se desdobrar. Com a maioria dos economistas agora prevendo uma recessão neste ano, as preocupações econômicas subiram para o topo da lista das preocupações dos eleitores. Por sua vez, isso fortaleceu a noção geral que já era robusta que 2008 será o ano dos democratas.
Então, será apenas uma questão de decidir quem será o candidato democrata e depois esperar que Hillary Clinton ou Barack Obama inevitavelmente capture a Casa Branca? Provavelmente, diz Ray C. Fair, economista de Yale cujo modelo de previsão amplamente citado prevê uma vitória democrata em novembro de 52% contra 48%, mesmo com uma leve desaceleração no crescimento.
O modelo de Fair, que tem uma margem de erro de 2,5%, prevê uma vitória democrata de 55% contra 45% se essa desaceleração de fato virar uma recessão. “Quase tudo, inclusive todos os fatores não econômicos, sugere uma vitória democrata neste ano”, diz ele.
Se a previsão de Fair se provar minimamente correta, será uma espécie de revolução na história política americana. A última vez que um candidato presidencial democrata venceu a presidência com mais da metade dos votos foi em 1976, quando Jimmy Carter derrotou Gerald Ford. No entanto, isso foi pouco mais de um ano após a crise de Watergate derrubar Richard Nixon e lançar uma pá de cal sobre os republicanos.
A única outra vez desde 1964 que um democrata conquistou mais da metade dos votos foi em 2000, quando Al Gore obteve um pouquinho mais que George W. Bush, em uma eleição decidida pela Suprema Corte. Também ocorreu no final de um dos mais longos períodos de crescimento da história americana, quase tudo sob um governo democrata.
“Al Gore perdeu a eleição de 2000 apesar da economia. Como era uma hora de contentamento econômico, a eleição de 2000 foi dominada por questões mais suaves”, diz Michael Feldman, que foi assessor sênior do então vice-presidente.
Talvez a eleição de recessão mais freqüentemente citada seja a de 1992, quando Bill Clinton habilmente explorou a falta de aptidão de George H. W. Bush lidar com o desaquecimento com o lema de campanha: “É a economia, estúpido”. Mas a recessão já terminara quando os eleitores foram para as urnas -e Clinton venceu com apenas 43% dos votos.
Muitos acreditam que o pai de Bush teria sido reeleito se não fossem os 19% dos votos da candidatura do terceiro partido, de Ross Perot. Clinton teve 49% dos votos em 1996, em um ano quando a economia era muito mais forte (Perot novamente concorreu, levando apenas 8% dos votos). Assim, a história recente sugere que seria heróico assumir uma retumbante vitória democrática em novembro.
“A idéia que uma desaceleração ou recessão dá uma clara vantagem ao concorrente presidencial democrata nem sempre tem base nos fatos”, diz Michael Lind, historiador político da New America Foundation em Washington. “Há no passado a mesma quantidade de evidências nos levando a crer que poderíamos ter um presidente republicano com um Congresso democrata em novembro ou um controle democrata de ambos.”
A história aponta para uma correlação ligeiramente maior entre os resultados eleitorais do Congresso e a ortodoxia econômica prevalecente. Por exemplo, o Partido Democrata controlou as duas casas do Congresso por virtualmente todo o período entre o final dos anos 40 e o final dos anos 60, quando o New Deal de Franklin Roosevelt comandou amplo consenso entre os eleitores. Ainda assim, os republicanos conquistaram a Casa Branca 50% do tempo.
Da mesma forma, muitos analistas políticos acreditam que a vitória democrata nas eleições ao Congresso de 2006, que levou ao fim de 12 anos de maioria republicana na Câmara dos Deputados, anunciavam uma rejeição de uma geração à economia conservadora - além do sentimento anti-guerra no Iraque que claramente motivou muitos eleitores.
A maior parte dos analistas prevê que os democratas vão aumentar sua maioria no Senado e na Câmara em novembro, independentemente de qual partido tomar a Casa Branca. “Uma desaceleração econômica provavelmente reforçará o que quase certamente será outro bom ano para os democratas no Congresso”, diz Charlie Cook, analista político de Washington. “Os eleitores já associam suas ansiedades econômicas com suas outras reclamações -de corrupção e política externa inepta - em relação ao Partido Republicano.”
De fato, o sentimento do eleitor americano sugere algo muito pior para o Partido Republicano como um todo do que a perspectiva de simplesmente levar a culpa por uma queda econômica de curto-prazo. As eleições de 2006 ocorreram depois de cinco anos de crescimento econômico robusto, nos quais muitos americanos obtiveram pouca melhoria em sua renda.
A estagnação da renda dos lares da classe média desde 2001 impõe um problema estrutural muito mais duro para os defensores do status quo do que os números econômicos do último trimestre. “O que é deprimente no Partido Republicano hoje é que não está admitindo a dor econômica que a maior parte da classe média americana está vivendo”, diz David Frum, ex-escritor de discursos de George W. Bush. Seu livro recente, “Comeback”, adverte que os republicanos enfrentarão um banimento eleitoral se não fizerem uma reforma. “É um partido que se tornou tão preso a interesses especiais que não pode honestamente lidar com questões como reforma na saúde, apesar do eleitor republicano estar sofrendo com a inflação no setor da saúde tanto quanto os outros.”
Frank Luntz, que faz pesquisas de opinião para o Partido Republicano, concorda. Ele aponta para a “estagnação intelectual” das idéias republicanas que dominam a política americana há uma geração. “A eleição do Congresso de 2006 foi apenas o começo da má notícia para o Partido Republicano”, diz ele. “Este ano, piora.”
Ainda assim, o candidato republicano terá uma oportunidade razoável de escapar do destino provável de seus colegas no Capitólio. Seja Mitt Romney, Rudolph Giuliani ou McCain, os três poderiam se dissociar de Bush.
Se fosse uma eleição mais típica, quando o candidato republicano é presidente ou vice-presidente, isso não teria sido possível. Mas nestas circunstâncias, a profunda impopularidade de Bush não precisa contaminar quem espera sucedê-lo. “A política presidencial em grande parte versa sobre o caráter individual dos candidatos”, diz Cook. “E nenhum dos principais candidatos republicanos está intimamente associado a Bush.”
O candidato republicano, entretanto, teria que dar um passo além do que simplesmente dissociar-se de Bush para produzir uma narrativa econômica que pareça convincente aos eleitores. Mais de 70% dos eleitores acreditam que o país está no “caminho errado” -uma medida historicamente alta de insatisfação pública. Esse número pode muito bem se deteriorar com o arresto esperado de até 2 milhões de casas nos próximos 12 meses.
Até agora, a maior parte dos analistas não está impressionada com as políticas econômicas que os pré-candidatos à presidência estão oferecendo. Enquanto seus colegas democratas rapidamente produziram seus planos de estímulo fiscal nas últimas três semanas, os republicanos foram lentos, senão embaraçosos. Por exemplo, o remédio inicial de McCain para o desaquecimento foi sugerir cortes nos gastos -uma medida que, em vez de combater, aprofundaria a recessão.
O plano de Giuliani foi um pouco melhor. Tendo negado no último mês que havia nuvens sobre o horizonte econômico, o ex-prefeito de Nova York recentemente propôs a redução no imposto corporativo e incentivos para reforçar o investimento. Os economistas salientaram que o efeito dos cortes de Giuliani começaria a ser sentido apenas no final da recessão.
Romney, que é o mais fluente em economia dos candidatos republicanos, também foi criticado por propor medidas que teriam pouco ou nenhum de curto-prazo na economia, como a extensão dos cortes de impostos de Bush (que expiram em 2010). “Nestas eleições, os republicanos provavelmente não podem se safar com sua dieta usual de otimismo e cortes nos impostos”, disse Jared Bernstein do Instituto de Política Econômica, um centro de estudos de centro-esquerda em Washington. “Eles terão que propor algo mais original.”
Tom Gallagher, diretor da firma especialista em pesquisa econômica International Strategy and Investment, é ainda mais direto. “Normalmente, quando Washington consegue aprovar um plano de estímulo fiscal, é um sinal que a recessão já terminou”, diz ele. “Mas os planos propostos pelos candidatos republicanos só começariam a ter efeito para a próxima recessão.”
Os dois principais candidatos democratas receberam notas bem mais altas pelo conteúdo de seus planos de estímulo fiscal e por terem refletido em suas plataformas políticas a sensação pública de insatisfação econômica desde o início da campanha há um ano.
Dadas as exposições detalhadas da política econômica, muitos assumem que Clinton está em melhor posição do que Obama para explorar uma recessão, cuja campanha lida com generalidades mais amplas (apesar de seu plano de estímulo ter recebido mais aplausos do que o de Clinton).
Os dois, entretanto, estão bem posicionados para entrar na eleição geral com um conjunto de políticas econômicas fabricadas para o humor do eleitorado -inclusive planos de universalização da saúde, maiores gastos em infra-estrutura e uma dose de ceticismo populista sobre as desvantagens da globalização.
Ainda assim, as eleições presidenciais, mesmo durante anos de recessão, nunca são puramente confinadas à economia. Nem está claro que os EUA estão entrando em recessão. A história também mostra que eleitores americanos são parciais a um governo dividido. “Se os democratas acreditam que fecharam a eleição presidencial porque a economia está caindo, podem ter uma surpresa desagradável”, diz Lind.
Tradução: Deborah Weinberg
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