Contaminação do espinafre
Em 2006, a contaminação de pacotes de espinafre fresco nos EUA com uma bactéria altamente tóxica provocou diversas hospitalizações. Meu relato do ocorrido (A volta dos alimentos contaminados, de 22/11/2006) provocou uma enxurrada de e-mails.
O relatório final da investigação confirma que produtos feitos com métodos “orgânicos” e distribuídos nacionalmente representam um novo tipo de risco alimentar.
Tudo começou em 22 de julho de 2006, quando um campo de 11.200 m2 foi plantado com espinafre pela Mission Organics em uma fazenda na Califórnia que estava em processo de certificação como orgânica.
Essa plantação foi contaminada com fezes de animais da região que continham a bactéria E. coli O157:H7, que existe normalmente no intestino de diversos animais. Em 14 de agosto, 450 kg de espinafre foram colhidos e processados pela Natural Selection Foods. O lote recebeu o número P227A.
O espinafre foi lavado diversas vezes, empacotado em aproximadamente 40 mil embalagens individuais e distribuído nacionalmente com a marca Dole Baby Spinach.
No dia 31 de agosto, uma senhora de 81 anos, Ruby Trauz, morreu no Estado americano de Nebraska após ter uma forte diarréia, que evoluiu para hemorragia gástrica e falência renal. Casos semelhantes começaram a surgir em mais de 26 dos 50 Estados dos EUA. Um total de 205 pessoas foram internadas nos dias seguintes com os mesmos sintomas. Como os casos pipocaram em diferentes regiões do país, demorou duas semanas para o governo concluir que havia relação entre eles.
Em 15 de setembro, o governo recomendou que nenhum tipo de espinafre fresco fosse consumido. No dia 20 de setembro, uma criança de 2 anos morreu em Idaho e muitas pessoas continuavam sendo hospitalizadas com falência renal.
Betty Howard foi a última vítima do espinafre a morrer, em 28 de janeiro de 2007, depois de quatro meses hospitalizada.
O espinafre produzido em uma área do tamanho de um quarteirão deixou quatro mortos e dezenas de pessoas com seqüelas da doença renal espalhadas pelo país.
O FDA, agência americana que regula alimentos e remédios, está revendo os regulamentos que determinam de que modo alimentos orgânicos devem ser produzidos. Como esses alimentos são tratados com técnicas tradicionais que não envolvem inseticidas, herbicidas ou adubos químicos, sua produção era pouco fiscalizada ou regulamentada.
Entretanto, com o crescimento brutal desse mercado e com a entrada de grandes grupos capazes de distribuir a produção de uma pequena fazenda por todo o território dos EUA, um pequeno erro local pode causar acidentes de grandes proporções.
Nos EUA, um dos países onde a segurança alimentar é alta por causa da intensa fiscalização dos métodos de produção de alimentos, ainda ocorrem entre 300 mil e 400 mil hospitalizações por contaminação alimentar todos os anos. Desses, 5 mil terminam com a morte do paciente, o que significa uma taxa de mortalidade de 1,7 pessoa por 100 mil habitantes por ano, um número da mesma ordem de grandeza do de pessoas que morrem assassinadas (5,5 pessoas por 100 mil habitantes).
Esse episódio demonstra que, apesar de as pessoas se preocuparem com a segurança de novas tecnologias, como inseticidas e transgênicos, não é razoável imaginar que, somente porque um produto estampa na embalagem uma imagem bucólica de uma fazenda ou a palavra “orgânico”, ele é mais seguro do ponto de vista alimentar.
Mais informações em: Investigation of an Escherichia coli O157:H7 Outbreak Associated with Dole Pre-Packaged Spinach (www.fda.gov/bbs/topics/news/2007/new01593.html).
* Biólogo (fernando@reinach.com)
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