Divulgação | Presidente Lula abastece trator com biodiesel durante inauguração de usina | | | |
| No centro do "boom" da bioenergia, dois combustíveis e dois modelos de produção com quase nada em comum. De um lado, o álcool, as megaplantações de cana-de-açúcar, a concentração das terras e da produção nas mãos de grandes grupos econômicos. De outro, o biodiesel, suas dezenas de possíveis matérias-primas e a garantia de acesso de milhares de pequenos agricultores ao ciclo produtivo. Até 2010, o governo estima que cerca de 10% dos pequenos agricultores do país engrossarão sua renda graças ao biodiesel. Serão 350 mil famílias envolvidas na produção de mamona, girassol, soja, algodão, dendê, pinhão manso e outras oleaginosas que podem ser transformadas em combustível. O mercado para a agricultura familiar está garantido graças ao modelo de benefícios fiscais montado pelo governo - usinas pagarão menos impostos se comprarem parte de sua matéria prima de pequenos produtores. "Estamos trocando impostos por inclusão social", disse, em entrevista a Terra Magazine, Arnoldo de Campos, coordenador do programa de biodiesel no Ministério do Desenvolvimento Agrário. Leia a entrevista a seguir: Terra Magazine - O senhor poderia explicar como funciona o selo social dos biocombustíveis? Arnoldo de Campos - O biodiesel é um combustível novo e já foi montado com esse enfoque na agricultura familiar. O selo Combustível Social foi uma idéia do governo federal para promover o interesse das indústrias de biodiesel por parcerias com a agricultura familiar. O selo é a porta de entrada para um conjunto de benefícios para as indústrias que promovem a inclusão social na cadeia produtiva do biodiesel. Entre os principais benefícios podemos destacar o tributário. Estamos trocando impostos por inclusão social. Quanto mais a agricultura familiar participa da cadeia produtiva, menos impostos federais a indústria vai pagar. Temos também os leilões de compra de biodiesel. Já gastamos ao redor de R$ 1,5 bilhão com compra de biodiesel por meio dos leilões organizados pela Agência Nacional do Petróleo, e um dos critérios para participar do leilão é ter o Selo Combustível Social. Ou seja, tem de ter parceria com a agricultura familiar para poder vender biodiesel nos leilões do governo. Um terceiro benefício: o BNDES oferece linhas de financiamento para biodiesel, e, quando essa indústria prevê a participação da agricultura familiar, ela tem descontos na taxa de juros e tem percentuais de cobertura de financiamentos maiores. Então o governo organizou um conjunto de incentivos para que essas indústrias estabeleçam parcerias com os pequenos produtores e assentados da reforma agrária. Quais são exatamente as contrapartidas das indústrias? Para obter o selo a indústria tem de cumprir três regras. Uma delas é comprar uma quantidade mínima de matéria prima da agricultura familiar. Ou seja, se essa indústria faz biodiesel, ela precisa comprar soja, girassol, mamona , palma, qualquer oleaginosa, ela vai ter de gastar um percentual mínimo do total com agricultura familiar. Esse percentual varia de acordo com a região: no Sul e no Sudeste, é de 30%. No Centro-Oeste e no Norte é de 10%, no Nordeste é de 50%. Esses percentuais foram definidos em função da maior ou menor presença da agricultura familiar na região. A segunda regra é que essas aquisições sejam feitas por meio de contratos, de forma que o agricultor, antes de plantar, saiba para quem vai vender, por quanto vai vender e em que condições vai vender. É a contratualização da cadeia produtiva, o que entre os grandes produtores já é uma rotina. A terceira exigência é a assistência técnica e a capacitação dos agricultores. Com exceção da soja, todas as demais são culturas incipientes, como girassol, dendê e a própria mamona. Então é responsabilidade da indústria garantir que esse agricultor tenha um acompanhamento técnico. Cumprindo os três requisitos a indústria obtém o selo e tem acesso aos benefícios. É dessa forma que hoje temos 68 mil famílias com contratos assinados. De área plantada, temos 250 mil hectares cultivados pela agricultura familiar no programa do biodiesel. São 14 usinas de biodiesel que já têm o selo social e estão operando, fornecendo biodiesel para a Petrobras. Do total de usinas, essas 14 representam uma parcela significativa? São quase todas. Das que estão em operação, a maioria absoluta tem o selo. Ou seja, o programa é atrativo. É atrativo por dois motivos. Primeiro, o benefício tributário é muito expressivo, A indústria que não tiver o selo vai pagar R$ 218 por metro cúbico de impostos federais. Se tiver parceria com a agricultura familiar, vai pagar R$ 70 por metro cúbico. É um desconto de mais de R$ 150 por metro cúbico ou 15 centavos por litro. E como é um produto em que a margem unitária é muito pequena, esses 15 centavos fazem muita diferença na rentabilidade da indústria. Nós procuramos mexer no bolso do empresário para que ele ficasse mais competitivo quanto mais agricultura familiar ele trouxesse para a sua base de suprimento, por conta de um desconto muito gordo nos impostos. O segundo motivo são os leilões. Os leilões são hoje praticamente a única forma de vender biodiesel no Brasil. O que define a agricultura familiar, é o tamanho da propriedade? São vários critérios, um deles é o tamanho da propriedade. O país tem uma coisa chamada módulo fiscal de terra, que é o que define o Imposto Territorial Rural. Na Amazônia os módulos são maiores, em São Paulo são menores, cada região tem um módulo. Para ser considerado agricultor familiar, o produtor não pode ter mais que quatro módulos fiscais. Isso pode chegar a 200 hectares em algumas regiões do país. Na região Sudeste chega a quanto? No Sudeste são 50, 75 hectares em média por família. Numa propriedade de 75 hectares, que renda uma família pode atingir com o plantio de matéria prima para biodiesel? Os agricultores familiares que já estão no programa - são cerca de 70 mil - plantam desde um hectare, dois hectares de mamona no Nordeste até 20, 40 hectares de soja no Centro-Oeste. Varia muito. A renda vai desde R$ 1.300 por ano/família até R$ 16 mil por ano/família. Depende da cultura, da produtividade, da tecnologia e da área plantada. É importante destacar que trabalhamos para que esta seja uma renda complementar, não estamos estimulando o agricultor a parar de plantar comida ou a parar de vender produtos que ele já está vendendo no mercado, como ocorre na grande maioria dos lugares onde estamos entrando. Eles continuam com suas atividades e agregam mais uma fonte de renda para a família. O segundo critério é a renda. A renda anual do agricultor familiar não pode passar de R$ 80 mil. Ou seja, não estamos falando só de agricultores miseráveis. A agricultura familiar vai desde o muito pobre, o assentado da reforma agrária, até uma espécie de classe média do campo, com mais de R$ 6.000 de renda mensal. O terceiro é o uso de mão de obra predominantemente familiar. Eventualmente pode ter mão de obra contratada ou até dois empregados permanentes. Com esses três critérios nós definimos o enquadramento no Pronaf, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar. Das 68 mil famílias que produzem para a cadeia do biodiesel hoje, quantas estão em projetos de reforma agrária? Não temos esse dado com precisão, mas mais de um terço das famílias são de assentamentos de reforma agrária. No Nordeste e no Centro-Oeste há um grande percentual de oriundos da reforma agrária. No Sul são mais agricultores familiares tradicionais. No Norte são todos assentados. Temos mais de 4 milhões de famílias que se enquadram nisso que nós chamamos de agicultura familiar de um total de pouco mais de 5 milhões de estabelecimentos agropecuários no país. E temos cerca de 700 mil assentados da reforma agrária. E desses 4 milhões de famílias, qual é o potencial de alcance do programa? Nós temos uma meta de chegar a 350 mil famílias em 2010, quando estaremos usando no diesel uma mistura obrigatória de 5% de biodiesel. Ou seja, pouco menos de 10% do total de agricultores familiares estará dentro do programa do biodiesel. |
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