USA: Republicanos entram no ano eleitoral sem favorito
Ricardo Balthazar
Valor
Mike Huckabee, o ex-pastor evangélico e candidato a presidente que virou a sensação da temporada no Partido Republicano, conhece a Bíblia de trás para frente. Na semana passada, quando um repórter de TV perguntou o que ele achava dos adversários, Huckabee recorreu ao versículo 17 do capítulo 54 do livro de Isaías, um dos profetas do Antigo Testamento.
"Toda arma forjada contra ti não prosperará; toda língua que ousar contra ti em juízo, tu a condenarás", diz a passagem. Esse tipo de retórica costuma agradar num partido em que os evangélicos são metade do eleitorado. Mas será preciso bem mais do que isso para vencer os diversos obstáculos que Huckabee e os republicanos enfrentarão na corrida à Casa Branca.
Sete candidatos brigam pela indicação do partido para concorrer na eleição presidencial de novembro do ano que vem. Huckabee e outros quatro têm chances. A disputa está tão embolada que alguns comentaristas começaram a cogitar a possibilidade de que a indefinição se prolongue por meses, e que o candidato republicano só seja conhecido em setembro, na convenção nacional da legenda.
É um cenário preocupante para os líderes partidários, porque faria os republicanos perderem um tempo precioso com a disputa interna e poderia transformar num desastre a convenção do partido, que em vez de celebrar a união partidária se tornaria palco para a batalha entre os vários grupos que brigam pelo controle da legenda.
As pesquisas mais recentes acabaram com a aura de favorito que o ex-prefeito de Nova York Rudy Giuliani vinha ostentando desde o início do ano. Ele ainda lidera a corrida entre os republicanos, mas tem apenas um quinto das preferências do eleitorado do partido. Em um mês, Giuliani perdeu um terço dos eleitores que o apoiavam e viu sua vantagem sobre os rivais tornar-se estatisticamente desprezível.
Huckabee disparou na frente dos outros em Iowa (veja quadro), o Estado que no próximo dia 3 será o primeiro a votar no processo de seleção dos candidatos dos partidos. Em New Hampshire, onde as eleições primárias serão realizadas uma semana depois, o ex-governador Mitt Romney e o senador John McCain lideram a corrida entre os republicanos.
Embora sejam pequenos, esses dois Estados são muito importantes no processo político americano por serem os primeiros a se manifestar. Os candidatos que triunfarem em Iowa e New Hampshire receberão tanta atenção que terão impulso para disputar os Estados maiores, que realizarão suas primárias em fevereiro. Os que se saírem mal na largada terão que fazer força para continuar no páreo depois.
Se nenhum dos candidatos republicanos que sobreviverem a esse processo despontar como um claro favorito, provavelmente será preciso esperar pela convenção para encontrar uma solução para o racha. Na convenção, 2.380 delegados escolhidos durante as primárias irão votar. Quem conquistar o apoio de pelo menos metade dos delegados será o vencedor e se torna o candidato do partido.
A última vez em que os republicanos chegaram tão divididos à convenção foi em 1976, quando o então presidente Gerald Ford disputou a indicação partidária com Ronald Reagan. Numa votação apertadíssima, Ford venceu Reagan com 57 votos além do mínimo necessário. Na eleição presidencial daquele ano, os republicanos foram derrotados pelo candidato do Partido Democrata, Jimmy Carter.
Alguns analistas duvidam que se chegue a esse ponto. Acham improvável que um número tão grande de candidatos tenha fôlego para ir até o fim das primárias e apostam que os líderes republicanos farão de tudo para evitar que o racha estrague a convenção. Um quarto dos delegados que terão direito a voto na convenção serão políticos e dirigentes partidários nomeados e não eleitos nas primárias.
A confusão entre os republicanos reflete a profunda crise de identidade que o partido atravessa após sete anos no poder com o presidente George W. Bush. Os eleitores evangélicos parecem entusiasmados com Huckabee, mas grupos conservadores influentes na base republicana torcem o nariz para seu estilo populista. Mais da metade dos eleitores republicanos estão indecisos, dizem pesquisas.
Também há vários candidatos brigando pela candidatura democrata, mas nas últimas semanas a disputa parece ter se reduzido ao confronto entre a ex-primeira-dama Hillary Clinton e o senador Barack Obama. É provável que um dos dois desista para apoiar o outro em fevereiro, após as primárias nos Estados maiores. Se a bagunça entre os republicanos ainda estiver grande, sorte dos democratas.
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