terça-feira, 13 de novembro de 2007

"Não coma gato por lebre", de Paulo Henrique Amorim para Folha de São Paulo


A Folha publicou neste domingo, dia 11, na pág. A18 (clique aqui para ler - apenas para assinantes) reportagem de Uirá Machado e Fernando Barros de Mello de titulo “Blogs políticos encenam nova ‘Guerra Fria’”.

. Eu sou um dos entrevistados.

. Antes da entrevista, informei ao repórter Fernando Barros de Mello que gravaria a entrevista e a publicaria no Conversa Afiada, depois que a Folha publicasse a reportagem.

. Você poderá ler a íntegra logo a seguir.

. Antes, gostaria de chamar a atenção para uma sugestão que fiz.

. Sugeri ao ombudsman da Folha que produzisse um “Não coma gato por lebre”, como existe aqui no Conversa Afiada. (Clique aqui para ler o nosso humilde “Não coma gato por lebre”)

. Para não enganar o leitor e explicitar os casos – se houver – de conflito de interesse.

. Poderia ser alguma coisa assim: “Quem chama os candidatos a Presidente da República por um nome só ?”.

. Por exemplo, quem chama José Serra de Serra ?

. Quem chama Aécio Neves de Aécio ?

. Quem chama Dilma Roussef de Dilma ?

. Quem chama o Ciro Gomes de Ciro ?

. Quem chama Nelson Jobim de Jobim ?

. Aí, o ombudsman colocaria uma tabelinha no pé da coluna dominical: “Os colunistas/articulistas A e B chamam José Serra de Serra e Aécio Neves de Aécio. Os colunistas C e D chamam Dilma Roussef de Dilma. E os colunistas E, F, G ..... até Z não chamam ninguém por um nome só.”

. Por que isso não entra no Manual de Redação da Folha ?

. Poderia ser até um motivo de interesse adicional: “O colunista Y passou a chamar Dilma Roussef de Dilma. O colunista H deixou de chamar José Serra de Serra”. E os leitores acompanhariam com interesse esse vai-e-vem de predileções – se houver, é claro.

. Uma espécie de reality-show da isenção do jornalismo brasileiro.

. Não faço a mesma sugestão ao Estadão e ao Globo porque os ombudsmen deles habitam num espaço entre o Olimpo e Urano.

. Ressalto que, no nosso modesto “Não coma gato por lebre”, incluí recentemente o presidente eleito José Serra, o último autoritário.

. Não é para ma gabar, mas se trata de um ato de inusitada ousadia: José Serra se comporta como o presidente eleito; o PIG o trata como o presidente eleito; e ele aparece em TODAS as pesquisas de opinião pública como líder absoluto de uma eleição presidencial apenas pró-forma: porque já se sabe que ele toma posse no dia 1º. de janeiro de 2011.

. Para facilitar a leitura, foram feitas pequenas modificações em relação ao que foi gravado.

Leia a seguir a entrevista que dei à Folha sobre os blogs:

Folha - A nossa idéia é discutir um pouco os diferentes matizes ideológicos, essa novidade do blog, que não é tão novidade assim, mas como é que são inclusive as brigas entre diferentes blogs. Um blog que tem um post e outro vai lá e comenta. É uma coisa interessante. Eu queria começar perguntando pela rotina. Como é que é a rotina de blogueiro?

Paulo Henrique Amorim – Eu acordo de manhã, leio todos os jornais, quer dizer, a Folha, o Estado, O Globo, Agora e o Jornal do Brasil e o Diário de São Paulo. Tomo café, leio enquanto tomo café. Depois eu abro o computador, vejo todos os portais brasileiros, visito alguns portais estrangeiros, alguns jornais estrangeiros. E aí começo a me comunicar com o Givanildo Menezes, que é o editor do Conversa Afiada, e a gente faz uma pauta do dia. Eu escrevo, eu entrevisto. Agora, por exemplo, acabamos de fazer uma enquête e um IVDL, que é um índice que eu concebi sobre a intensidade de manifestações que têm o objetivo de derrubar o Presidente Lula. E devo te dizer que essa é a parte que mais me diverte, que é conceber enquetes e as perguntas do IVDL. Isso me dá um prazer especial. E aí, pronto, o dia rola. Eu posso estar fazendo isso de casa, posso estar fazendo isso da Record, posso estar fazendo isso de Nova York, posso estar fazendo isso de um engarrafamento na Marginal do Tietê, de qualquer lugar.

Folha – Então, mas isso que eu ia perguntar, dessa briga, dessa questão de brigas de diferentes matizes. No IVDL, por exemplo, uma das suas enquetes era: “A Miriam Leitão foi viajar”. No blog isso...

Paulo Henrique Amorim – Não, é que as férias da Miriam Leitão estão no fim. Qual a intensidade desse retorno no Índice Vamos Derrubar o Lula ?

Folha – Isso. E o blog permite isso, as pessoas serem mais francas?

Paulo Henrique Amorim – O blog permite.

Folha – Você acha que a briga, por exemplo, entre direita x esquerda, sei lá, é mais forte?

Paulo Henrique Amorim – Eu não sei se é uma briga entre direita x esquerda. A minha tese é que a imprensa escrita brasileira é tão ruim, é tão carente de informações relevantes, que ela deixou de oferecer ao leitor as diversas opiniões, as diversas perspectivas. Além disso, surgiram aqui no Brasil, como um fenômeno simultâneo, portais na internet com qualidade. Os dois fenômenos, somados, permitiram o aparecimento desses espaços de opinião na internet. Isso não tem, por exemplo, que eu saiba, não tem nos Estados Unidos, não tem na Europa, não tem na América Latina. Porque esse debate, lá, se trava na televisão, no rádio, no jornal ou na revista. Só que aqui, todos os jornais e todas as revistas – com a exceção da Carta Capital e da Caros Amigos – têm posição conservadora contra o Lula. Então, perde a graça. Você pega o New York Times, por exemplo, você tem colunistas de inclinação conservadora e colunistas de inclinação não-convervadora, digamos assim. Tem colunistas de inclinação republicana e tem colunistas de inclinação democrata. Aqui no Brasil, não. Todos os colunistas têm a mesma inclinação.

Folha – Mas isso, você diz, no espaço de opinião.

Paulo Henrique Amorim – Isso no espaço de opinião. Isso permitiu que surgisse na internet essa discussão e para mim foi ótimo. Eu me senti rejuvenescido profissionalmente, porque o meu espaço - como eu digo lá - é um espaço de opinião e informação. A gente faz reportagens, a gente tem um vídeo em forma de reportagem por dia. É um trabalho tecnicamente irretocável, não tem nada de opinião ali, é reportagem, reportagem de televisão. Aquilo ali poderia ser exibido em qualquer emissora de televisão, no Jornal Nacional, no Jornal da Record, qualquer jornal. E tem as minhas manifestações, que são as manifestações pessoais, minhas, que eu chamei, plagiando o Barão de Itararé, de Máximas e Mínimas. Aquilo ali é a minha opinião. E para não enganar ninguém, eu botei lá de quem eu gosto e de quem eu não gosto. Aquela lista ali está um pouco incompleta porque à medida que o tempo passa, eu acrescento mais pessoas e circunstâncias de que eu não gosto. Isso é muito salutar e é uma sugestão que eu faria ao ombudsman da Folha. (Eu não falo do ombudsman do Globo, porque o ombudsman da Globo é o Roberto Marinho, que controla o Globo de Urano. Então, não adianta, porque não temos como nos comunicar com ele.) Eu sugiro ao ombudsman da Folha que os colunistas da Folha dissessem assim: sou amigo do candidato à Presidência da República fulano de tal. Sou adversário feroz do candidato fulano de tal à Presidência da República. Que é porque quando o cara ler, o cara saber: ah, esse aqui é amigo do fulano, esse aqui é amigo do beltrano, que é para não enganar ninguém.

Folha – E para o leitor da Folha saber quais são seus amigos e seus inimigos.

Paulo Henrique Amorim – Isso, exatamente. Quem entra no Conversa Afiada, se ele é amigo do Fernando Henrique e do Daniel Dantas, das duas uma: ou ele gosta de sofrer ou ele quer se divertir. Porque não há a menor possibilidade de eu elogiar o Fernando Henrique e o Daniel Dantas.

Folha – Por quê?

Paulo Henrique Amorim – Porque eu acho que o Daniel Dantas tem uma peculiaridade muito interessante que é o fato de que na Justiça que se trava em língua inglesa ele é sempre condenado. Na Justiça brasileira ou ele é absolvido ou ele não é julgado. Eu tenho a impressão de que é possível que, em algum momento, as tratativas da Justiça que se trava em língua portuguesa acabarão por encontrar os mesmos motivos que levam ele a ser condenado em língua inglesa. E o Fernando Henrique Cardoso, eu considero um blefe. Um blefe político, um blefe intelectual, um blefe... em tudo.

Folha – E os seus amigos, quem são? Quando você disse assim, separar em amigos...

Paulo Henrique Amorim – Mas os meus amigos não são notórios, não são notáveis. Eu, por exemplo, tenho um grande amigo que é o Mino Carta, que fica óbvio porque nós nos correspondemos através do blog dele. Eu freqüentemente chamo ele (no Conversa Afiada). Mas, em geral, os meus amigos não são pessoas que estejam na mídia. Agora eu estive no Rio de Janeiro, passei um sábado adorável comemorando os 80 anos do Gazzaneo. O Gazzaneo foi chefe de reportagem do Jornal do Brasil, o Luiz Mário Gazzaneo. E hoje é um alto funcionário do IBGE. E encontrei lá muitos amigos e rimos muito. Mas não faria sentido eu fazer uma lista dos amigos porque não são, assim, personagens da cena pública.

Folha – E quando dizem que o seu site é mais alinhado com o governo, é verdade essa descrição?

Paulo Henrique Amorim – A mim, non me frega niente, a me non me frega niente porque não é verdade. Eu, por exemplo, nunca entrevistei o Presidente Lula desde que ele foi eleito Presidente da República. Já tentei e não consegui, entendeu ? A última vez que eu conversei com o ministro Guido Mantega foi quando ele lançou o PAC, que já tem quase um ano de vida. Isso não é uma coisa que me atinja. Eu não tenho nenhuma ligação com o PT, não tenho nenhuma ligação com o Governo Lula, isso é uma acusação que podem fazer como qualquer outra. A mim não me inibe nem me desencoraja esse tipo de comentário.

Folha – E nos blogs, nos outros blogs? Quem você lê?

Paulo Henrique Amorim – Eu leio todos.

Folha – Exemplo.

Paulo Henrique Amorim – Por exemplo, o Daily Kos, que é o do Moulitsas, que é o principal blog americano democrata e eu visito o Moulitsas todos os dias. E aqui no Brasil também eu visito todos eles. Eu não vou citar os nomes porque eu não quero esquecer nenhum e criar alguma incompatibilidade. Mas eu leio tudo. Tudo, tudo.

Folha – Do que se poderia chamar de adversários.

Paulo Henrique Amorim – Eu não tenho adversários, eu tenho divergências. E por exemplo, essa minha, digamos, implicância com a Miriam Leitão, que é uma pessoa adorável, que é uma pessoa que eu respeito muito, que é uma profissional maravilhosa, o problema da Miriam Leitão não é a Miriam Leitão. O problema da Miriam Leitão é a hegemonia da Globo. Só a Globo permite que um jornalista tenha a exposição que a Miriam Leitão tem no conjunto de mídia que a Miriam Leitão alcança. E a Miriam Leitão na televisão não deveria ter o direito de dizer o que diz. Nem ela nem o Jabor. Porque a televisão aberta é uma concessão de serviço público. É que o Governo Lula é muito frouxo. Porque o Governo Lula deveria entrar com uma ação administrativa na Justiça. Toda vez que a Miriam Leitão dissesse que o Brasil ia quebrar, que o Rio Madeira ia matar os bagres – que as represas do Rio Madeira iam matar todos os bagrezinhos, ia tudo ficar capado, não ia poder reproduzir, tinha que ter o direito de resposta: “não, o bagre não vai ficar capado”. Mas é que o Governo Lula tem medo da imprensa. A Cristina Kirchner foi eleita com a maior diferença da história política da Argentina desde a redemocratização e não deu uma única entrevista a um jornal argentino. O presidente Hugo Chávez dá uma banana para a mídia conservadora e venezuelana e aqui o PT tem um pânico. Se o William Waack ligar para o Marco Aurélio Garcia, o Marco Aurélio Garcia interrompe uma conversa que ele esteja tendo com o Vladimir Putin para atender o William Waack. O William Waack é mais importante que o Vladimir Putin para o Marco Aurélio Garcia. Ele desliga o telefone. Camarada Putin, “pá”, e desliga o telefone e vai atender: “oi, William”. Ele vai lá correndo.

Folha – E na blogosfera isso funciona também, essa questão de ataques, do poder, como é que você avalia isso nos blogs?

Paulo Henrique Amorim – Não entendi.

Folha – Porque a gente está falando aqui de outras mídia, a Globo, de televisão.

Paulo Henrique Amorim – O que eu acho é que na internet, nos portais, foi possível, por uma circunstância efêmera, espero que não seja efêmera, mas temo que seja efêmera, por uma circunstância foi possível abrir espaço para algumas pessoas dizerem algumas coisas. Por exemplo, eu posso dizer, o Nassif pode dizer, o Mino pode dizer, eu espero que o Azenha brevemente tenha mais exposição do que tem hoje. E isso é uma janela que se abre num ambiente totalmente não-democrático. Em nenhuma democracia do mundo, de 190 milhões de brasileiros, nunca se poderia imaginar que houvesse três jornais e uma emissora de televisão. Isso não se reproduz em nenhuma democracia do mundo, talvez só na Rússia, que não é uma democracia.

Folha – Mas uma das críticas que se faz, por exemplo, à questão do iG, que teria dinheiro público, que tem dinheiro público.

Paulo Henrique Amorim – Não tem dinheiro público. Que história é essa que teria dinheiro publico?

Folha – Que teria dinheiro...

Paulo Henrique Amorim – Do quê?

Folha – Dos fundos de pensão, BNDES.

Paulo Henrique Amorim – A BrT (Brasil Telecom) é a principal acionista do iG e é uma empresa que está na Bolsa. (Se quiser) compre ação da BrT na Bolsa. Qual é o problema? (Também são acionistas os fundos de pensão Previ, Funcef e Petros e o Citibank.) E é o portal mais democrático, o portal mais aberto.

Folha – Por quê?

Paulo Henrique Amorim – Porque é um portal que não está vinculado ideologicamente, doutrinariamente, a uma posição anti-trabalhista. A imprensa brasileira é anti-trabalhista. A imprensa brasileira é assim desde sempre. Ajudou a derrubar o doutor Getúlio, quase não deixa o Juscelino Kubitschek tomar posse, ajudou a derrubar o João Goulart e não queria deixar o Brizola ser eleito Governador do Rio. E agora quer derrubar o presidente Lula. Se bobear, eles derrubam o presidente Lula. Isso é do DNA da imprensa brasileira. E os portais Folha, Globo, Folha-Online, Agência Estado e Agência O Globo evidentemente que estão na mesma família genética. E o iG é um caso particular, porque houve uma troca de comando na Brasil Telecom. O Daniel Dantas foi afastado, entrou uma nova administração que resolveu fazer um portal plural. Do que me beneficio, do que se beneficia o Mino Carta, do que se beneficia o Luís Nassif.

Folha – Inclusive o Diogo Mainardi escreveu uma coluna criticando isso, falando que as pessoas que estavam no iG estariam mais alinhadas ao Governo.

Paulo Henrique Amorim – O Diogo Mainardi fez uma acusação pessoal a mim e, por isso, eu o processo no crime, e processo a ele e a Editora Abril no cível por causa dessa acusação que ele fez e ele vai ter que provar na Justiça.

Folha – Mas voltando à questão dos blogs, você acha que as posições são mais acirradas nos blogs?

Paulo Henrique Amorim – Olha, eu falo por mim, eu sempre fui assim. Isso que eu escrevo hoje é a minha posição desde sempre. É que antes eu não tinha esse espaço. Essas são posições e opiniões que eu venho amadurecendo ao longo de muito tempo e antes eu não tinha onde expressá-las. Na Record eu não posso expressar porque a Record não é minha. A Record é do Edir Macedo. Quem tem que tomar posição ali é o Edir Macedo, se tomar, se quiser tomar. Até hoje ele não tomou e eu espero que não tome, porque ele assumiu publicamente o compromisso na inauguração da Record News de que a Record News, como a Record, são emissoras que estão abertas a todos os credos, a todas as etnias, todas as posições políticas, sem discriminação de nenhum brasileiro. Então, não há veto na Record. Mas acontece que quem dá a linha editorial é ele e as pessoas que estão subordinadas diretamente a ele. Eu não tenho direito de usar um espaço público, que é uma televisão, controlada por um empresário que é o Edir Macedo, para dar as minhas opiniões. As minhas opiniões eu dou nos meus livros, nos meus artigos e no meu espaço na internet.

Folha – Então, mas aí a gente estava conversando de opiniões, por exemplo, da Miriam Leitão, eles também podem dar as opiniões deles...

Paulo Henrique Amorim – A Miriam Leitão pode dar a opinião que ela quiser. Menos na TV aberta.

Folha – Tá, eu queria entender isso.

Paulo Henrique Amorim – Na TV aberta não pode. TV aberta é o seguinte. A TV aberta se propaga através do éter. O éter é um bem público, administrado pelo Estado brasileiro, em nome da nação brasileira, ou seja, do povo brasileiro. Então, os ordenamentos jurídicos pegaram o éter e entregaram um pedaço desse éter à família do Roberto Marinho - atualmente a seus filhos - para controlar. Agora, isso pertence ao povo brasileiro, através de uma série de mediações institucionais, previstas na Constituição. Você não pode utilizar um bem público para defender sistematicamente, invariavelmente, a mesma posição, que é a de ser contra o Governo Lula. Isso não pode. Agora, isso só acontece porque, na minha opinião, o Governo Lula não reage e não diz assim: “um momentinho, agora eu quero ter o direito de resposta”. No jornal impresso não tem problema nenhum. A Miriam Leitão pode dizer o que quiser, pode pregar a instauração da Monarquia, pode defender o anarquismo desenfreado, o que ela bem entender. Porque só compra O Globo quem pagar. Eu pago e leio. Agora, TV aberta, não. TV fechada, sim. Porque eu pago, vou lá, compro e aí, comprou, comprou. Agora, TV aberta nãozinho. TV aberta é um bem público. Agora, não é só na Venezuela que é assim, não. É nos Estados Unidos, é na Inglaterra, é na França, é na Itália, é no mundo inteiro. Aqui é que é uma pré-democracia tropical, entendeu ?

Folha – Mas voltando ao tema dos blogs, e os leitores? Como são os seus leitores, desde page views por mês, você tem aquele leitor que está sempre ali, quais são as posições principais?

Paulo Henrique Amorim – Olha, nós temos um contato freqüente com os leitores, através dos comentários, através das votações nas enquetes. A gente teve que fazer uma triagem, um scanning desses comentários, porque havia manifestações de racismo, havia calúnias pessoais, não só contra mim, mas contra outras pessoas, havia acusações que não poderiam ser comprovadas. Então, nós utilizamos uma tecnologia que o iG nos fornece que é nós lermos antes. O que não se enquadra nessas categorias – pedofilia, essas coisas horrorosas –, a gente manda, publica tudo e tal. Os nossos leitores, em geral – eu acompanho sempre, leio sempre, me divirto muito –, são primeiro, ou pessoas dramaticamente a favor, ou dramaticamente contra. A internet tem essa virtude. Não tem “em cima do muro”. Não dá pra ser tucano nessa acepção. Ou o cara é miseravelmente contra ou é apaixonadamente a favor. E aí é interessante porque é uma batalha entre eles. E eu acho isso muito bom, eu acho isso muito positivo. E eu pego muitas dicas deles, muitas idéias, algumas perversidades, por exemplo, que aparecem sob a forma de enquete e no índice IVL eu extraio freqüentemente dos meus leitores mais sádicos.

Folha – Teve alguma briga que você lembre, de posições extremadas...

Paulo Henrique Amorim – A questão do aborto, por exemplo, que eu discuti agora nesse fim de semana. A questão da foto do delegado... como é que chama?

Folha – O Bruno.

Paulo Henrique Amorim – O Bruno. O nobre delegado Bruno. Aliás, se você conseguir descobrir onde está o delegado Bruno, você me avisa porque eu gostaria de saber o que ele está fazendo, o delegado Bruno. Eu procuro sempre saber onde está o delegado Bruno.

Folha – Mas então, a gente começou conversando sobre aquela coisa direita x esquerda na blogosfera, há um clima de tensão. Você acha que é assim?

Paulo Henrique Amorim - É mais nuançado do que isso, direita x esquerda. Tem muitos subitens e sub-departamentos na direita e na esquerda. Eu acho que o norte que separa hoje, pelo menos na minha cabeça, esse espectro político-partidário brasileiro é... você quer reduzir impostos ou quer distribuir a renda? Não vale dizer: “eu quero os dois”. Isso aí não pode. É um ou outro. É aquela coisa do conto do Eça de Queiroz: você tem que apertar um botão e matar o outro. Você mata reduzir impostos ou mata distribuir a renda ? Eu mato reduzir impostos e fico com distribuição de renda. Eu. Isso é uma divisão entre blogueiros e na própria sociedade brasileira. Outra divisão é a seguinte: você quer ter outro paulista Presidente da República? Eu não quero. Chega de São Paulo. Moro em São Paulo, minha filha é paulistana, sou felicíssimo aqui, tudo ótimo. Agora, chega. Vamos trocar. Eu quero mudar de sotaque. Eu quero sotaque nordestino, carioca. Eu sou carioca, filho de baiano, casado com uma carioca filha de paraibana. Então, eu cansei, cansei. Desse paulicentrismo, desse paulistério, desse “uspismo”, porque “só tem gente inteligente na USP”, ou “se não é da USP não tem talento”. Cansei. Disso aí eu cansei. Então, quero um mineiro, quero um gaúcho, paraibano, amazonense.

Folha – E a gente está falando de poder. Os blogueiros têm seguidores, quase seguidores?

Paulo Henrique Amorim – Eu acho que não. Eu acho que é um exercício de... quando eu escrevo eu tenho a impressão de que eu to indo para uma pracinha que tem lá perto de casa, como se fosse um banquinho de botequim, e fico berrando lá. E vem um: “oh, seu idiota, não é nada disso”... Eu acho que é um pouco isso, multiplicado por “n” vezes. Mas não é nada mais do que isso. É um exercício de pancadaria verbal, de pancadaria ideológica. E tem que ser pancadaria. O meu amigo e um dos melhores analistas políticos do Brasil, na minha opinião, o Zé Simão, diz que a internet é isso mesmo, é anárquica, é irreverente. Você entrar na internet de terno e gravata e começar a chamar as pessoas de Vossa Excelência, você foi para o lugar errado.

Folha – Isso é que é interessante, essa é que é a pauta, a questão da pancadaria ideológica na internet. Quem você vê em diferentes lados aí, desse pessoal que está na internet?

Paulo Henrique Amorim – Olha, eu não vou tratar de nomes. Eu acho que a questão não é de nomes. Eu acho que existe uma parte da internet, nos portais, os blogs, que são filiados contratualmente aos grandes portais conservadores: Folha, Estado e Globo. E dessa matriz doutrinária, fornecida pelas empresas que controlam esses portais, é que saem os seus frutos, os seus jornalistas que têm os blogs. Então, não adianta você esperar, por exemplo, que O Globo tenha uma posição interessante. O Globo é hoje contra o Presidente Lula, é contra o Governador Sérgio Cabral e é contra o Prefeito Cesar Maia no Rio de Janeiro. É ótimo, formidável. Agora, acontece que isso é feito de uma forma que não dá ao leitor do Globo a oportunidade de imaginar que ele possa estar errado. Então, a cobertura do fechamento do túnel Rebouças é uma cobertura parcial. A cobertura da discussão da CPMF é uma discussão parcial. A cobertura de como o Sérgio Cabral está enfrentando o problema do narcotráfico no Rio de Janeiro é uma cobertura parcial. E esse parcialismo se espraia, ele acaba irrigando tanto os colunistas do jornal quanto da televisão, quanto da internet.

Folha – Mas aí o iG, por exemplo, não vem para ser o outro lado?

Paulo Henrique Amorim – O iG não vem pra ser nada. O iG vem para ser um portal e abrigou aqui os conservadores e os espiroquetas como eu e pronto. E cada um diz o que pensa, desde que respeite algumas regras de civilidade e de bom senso, tudo bem. O iG não pretende ser nada. O iG pretende ser um portal que presta serviços e no que concerne ao jornalismo – eu falo isso de espiroqueta que eu sou, porque eu não tenho autoridade nenhuma para falar pelo iG –, mas eu acho que o papel do iG é o de oferecer ao seu leitor o máximo de opções possíveis.

Folha – Mais do que em outros lugares?

Paulo Henrique Amorim – Não necessariamente por virtude do iG. É porque nos outros você só tem uma opinião.

Folha – E quando você falou de embates ideológicos, você se lembra de algum embate com algum blogueiro que marcou? Porque o Reinaldo Azevedo, por exemplo, já fez comentários sobre...

Paulo Henrique Amorim – Mas eu não vou personalizar a discussão. Eu não vou brigar com o Reinaldo Azevedo, eu não vou brigar com mais ninguém, eu não quero brigar com ninguém. Eu só quero fazer amigos e influenciar pessoas. Eu quero defender as minhas idéias. Eu quero expor essas idéias desse palanque privilegiado que eu tenho, que é o palanque que eu tenho no iG, e dizer, por exemplo: hoje a prioridade no Brasil não é cortar imposto. É distribuir renda. O Brasil não pode ter outro presidente paulista. Porque o paulistismo, o paulistério ... a eleição de um paulista, a preservação do paulistério no comando da República representa a preservação de um tipo de elite branca que eu acho que não pode mais governar o Brasil. Elite branca que se nutre e se ilustra com esse sol, que é o Fernando Henrique Cardoso, que eu apelidei – acho que de uma maneira muito engraçada – de Farol de Alexandria, aquele que lançava luzes sobre a Antiguidade e foi destruído num terremoto.

Folha – Mas daí, então, a blogosfera é uma espécie de Guerra Fria?

Paulo Henrique Amorim – É uma espécie de Guerra Quente. Quando a gente senta no computador para escrever é como se a gente estivesse apertando aqueles botões que disparam mísseis.

Folha – Na hora que você está escrevendo você pensa em quem você vai atingir?

Paulo Henrique Amorim – Penso, penso. Sei direitinho. Cada vírgula minha tem um alvo. As pessoas não percebem, mas eu sei.

Folha – E quem são os alvos, tirando o Fernando Henrique, porque a gente já sabe.

Paulo Henrique Amorim – Está tudo lá. Eu acho que eu preciso atualizar o meu “Não Coma Gato por Lebre”, porque eu tenho falado muito do José Serra, a quem eu chamo de presidente eleito. José Serra, o último autoritário. O José Serra eu acho que merece estar no “Não Coma Gato por Lebre”.

Folha – E é possível viver só de blog no Brasil?

Paulo Henrique Amorim – É, eu acho que sim. Eu acho que sim, assim como é possível viver só de blog nos Estados Unidos. Crescentemente o blog vai encontrando os caminhos de se financiar.

Folha – Quer dizer, se você tivesse só o iG você conseguiria...

Paulo Henrique Amorim – Aí já é uma outra discussão, eu não pretendo entrar nela, mas eu prefiro ter a colaboração importante do departamento de tesouraria da TV Record.

Folha – E o blog traz uma outra oportunidade, de dar palestra...

Paulo Henrique Amorim – Não, não. Isso quem traz é a televisão. A vitrine para fazer palestra é a televisão.

Folha – Mas sabe porque eu estava com a imagem da Guerra Fria, é que eu estava lendo comentários no seu blog, em outros blogs. Aí, entram muitos leitores, por isso eu falei dos seguidores, e começam a falar no blog de um no blog de outro.

Paulo Henrique Amorim – Ah, sim. O negócio tem uma cross fertilization.

Folha – Como é que você acompanha?

Paulo Henrique Amorim – Eu acompanho. Aí, quando ele se refere a um blog eu vou lá, vejo, volto. É interessante. Eu acho que isso enriquece de uma forma fascinante esse mundo de se informar. E eu espero que isso seja crescentemente importante aqui no Brasil. Porque você depender dessa imprensa aí, da TV Globo, você está ferrado. Você, por exemplo, pensa que a Cristina Kirchner vai perder a eleição. Ao você ler a imprensa brasileira, a Cristina Kirchner ... é uma surpresa a vitória dela.

Folha – Alguma espécie de mágoa da Globo, de críticas a ela?

Paulo Henrique Amorim – Em relação a mim? O que é isso ? A Globo está no Olimpo e eu estou no...

Folha – Você em relação à Globo.

Paulo Henrique Amorim – Nenhuma mágoa. Eu saí da Globo para ganhar mais. Eu dobrei o meu salário quando eu saí da Globo. Por que eu vou ter mágoa da Globo?

Folha – Uma última pergunta, de ler os comentários dos outros. Acho que foi no blog do Reinaldo que eu li, falava assim: “porque o Paulo Henrique, por exemplo, teve passagens paga pelo Governo para dar palestra em Brasília”.

Paulo Henrique Amorim – Mentira.

Folha – É isso que eu ia perguntar. Porque leitores trazem esse tipo de coisa.

Paulo Henrique Amorim – Isso aí é o tipo de questão que você só trata com advogado. E a minha impressão é que eu resolvi anular Karl Marx e criei a minha própria teoria do Capital. Eu acho que... eu não sou o Fernando Henrique Cardoso, nem daqueles que estudaram seis anos O Capital ..., mas eu tenho a minha própria teoria do Capital. Eu acho que o que define o sistema capitalista é você juntar dinheiro para contratar advogado. Então, esse tipo de acusação, por exemplo, como a que me fez o Diogo Mainardi, a gente só resolve com advogado. Não adianta ficar batendo boca na imprensa. Tem que contratar um advogado e processar.

Folha – E isso vai crescer com a internet? Você acha?

Paulo Henrique Amorim – Deve crescer. Porque é preciso responsabilizar as pessoas que escrevem na internet. Eu sou a favor de processar, eu sou a favor de chamar à responsabilidade. Não tem conversa. Eu estou processando o Diogo Mainardi e acho que vai ser interessante acompanhar esse processo. E eu espero que isso se multiplique. Por exemplo: se vivesse hoje na internet e com esse novo ambiente político que há no Brasil, o Paulo Francis estava na cadeia há muito tempo, entendeu?

Folha – Por quê?

Paulo Henrique Amorim – Por exemplo, o Sérgio Cabral processou e ganhou um bom dinheiro. Porque o Paulo Francis disse que o Sérgio Cabral tinha roubado o título do Pasquim. Já naquele tempo, o Sérgio Cabral processou o Paulo Francis. Hoje, então, seria uma farra.

Folha – E na internet você vê isso...

Paulo Henrique Amorim – Eu acho que isso vai acontecer muito.

Folha – Por quê?

Paulo Henrique Amorim – Porque as pessoas acham que têm a liberdade de dizer qualquer coisa, de ofender os outros e aí as pessoas que se sentirem ofendidas vão processar.

Folha – E isso cabe à Justiça.

Paulo Henrique Amorim – Eu tenho essa posição. É muito mais interessante você contratar um advogado do que ficar batendo boca na internet. Tá bom?

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