segunda-feira, 28 de maio de 2007

'80% do contrabando chinês vêm do Paraguai'

CORPO A CORPO
ROSANA PINHEIRO MACHADO
PEQUIM.

Entre os estandes do mercado Xiushui, em Pequim, um dos maiores pontos de venda de falsificação da capital chinesa, a antropóloga Rosana Pinheiro Machado, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, parece mais uma compradora. Na verdade, está terminando sua pesquisa para a tese de doutorado “Made in China”, patrocinada pela Weimer Grem Foundation, que pretende mostrar como funcionam as redes de contato que possibilitam o contrabando de produtos chineses para o Brasil via Paraguai. Autora de uma tese de mestrado sobre o contrabando paraguaio para o Brasil (“La garantia soy yo”), a pesquisadora decidiu ir à China saber onde tudo começa.

O GLOBO: Por que começou a pesquisar o contrabando na China?

ROSANA PINHEIRO MACHADO: Ao fazer minha tese de mestrado sobre o contrabando do Paraguai para o Brasil, que começou em 1999, percebi que as redes funcionam com chineses e paraguaios no Paraguai importando produtos da China. Com base na pesquisa com autoridades e fabricantes nos três países, estimo que 80% do contrabando chinês vendido no Brasil passam pelo Paraguai.

O Globo: Como os dados são recolhidos?

ROSANA: Visito as inúmeras fábricas que produzem artigos falsificados na costa de Guangdong, a província mais industrializada no Sul da China e onde começaram as zonas econômicas especiais, como Shenzhen. As estimativas mais conservadoras mostram que há cerca de três mil fábricas especializadas em pirataria, mas as maiores fornecedoras acabam sendo as que produzem oficialmente para as grandes marcas.

O Globo: E como isso ocorre?

ROSANA: Na base das relações pessoais, as redes de relacionamentos, ou guanxi, como se diz aqui. Esta rede é 100% informal e conta com os policiais e fiscais da região, os mais ricos da China: mantêm padrão de vida de quem ganha o triplo de seu salário. O governo é no mínimo leniente com a pirataria. Afinal, são milhares de empregos e renda. Todos repetem a famosa frase de Deng Xiaoping: “Não importa a cor do gato desde que ele saiba caçar ratos”.

O Globo: E como foi sua experiência?

ROSANA: Um policial graduado da região me levou às fábricas, onde estrangeiros não podem entrar, no continente e em navios no mar do Sul da China, com entre cem e 200 funcionários, a maioria imigrantes. Alguns gerentes me diziam que forneciam para grandes grifes, mas faziam cópias piratas se alguma outra empresa encomendasse. Em todas, o policial ganhou presentes.

O Globo: E como funciona esta proteção às fábricas piratas?

ROSANA: Não há como atravessar a fronteira entre Shenzhen e Hong Kong carregando muambas sem a conivência da polícia local. Além disso, os empresários me diziam que a maneira mais barata de entrar para o mundo dos negócios na China é abrir uma empresa pirata. Estas empresas acabam crescendo e há um acordo informal com o governo para que se legalizem. Eles criam uma grife e passam a fazer produtos muito parecidos com os falsificados, com nomes locais. Com o tempo, investem em marketing. Pronto, o negócio está legalizado. (Gilberto Scofield Jr., correspondente) Leia reportagem completa no jornal O Globo (para assinantes)

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