domingo, 11 de novembro de 2007

Etanol: Brasil corre o risco de perder liderança

Estados Unidos avançam nas pesquisas científicas para produzir álcool a partir de diferentes tipos de resíduos

Liana Melo*
Enviada especial - O GLOBO
WASHINGTON e DENVER
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O Brasil virou um aliado fundamental no esforço concentrado dos Estados Unidos para reduzir sua dependência do petróleo.

Do alto de uma produção de 18 bilhões de litros de etanol, o Brasil está nadando de braçadas, já que é o único país onde a produção não depende de subsídios governamentais para sobreviver e mais, ser competitiva. Só que essa liderança mundial está correndo sérios riscos.

O país pode perder a corrida tecnológica caso não acelere imediatamente as pesquisas em etanol de celulose ou de segunda geração, que inclui diferentes tipos de biomassa, como bagaço de cana-de-açúcar, palha de milho, resíduos de madeira, trigo, capim, sorgo.

O protagonismo brasileiro no etanol está sendo ameaçado justamente por aquele que, hoje, depende do Brasil: os Estados Unidos.

EUA vão investir US$ 1,5 bi em pesquisa
Em 2008, o governo americano está planejando investir US$ 1,5 bilhão em pesquisas energéticas, e o etanol de celulose vai receber US$ 200 milhões.

A parceria governamental com o setor privado e a academia começou em 2006 e já está bastante azeitada. Já no Brasil, a corrida tecnológica está mais lenta e menos organizada.

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) ainda está concluindo o primeiro edital para induzir pesquisas com etanol de celulose. O orçamento é de R$ 22 milhões e a previsão é que os projetos sejam julgados e selecionados até o dia 14 de dezembro, segundo José Oswaldo Siqueira, diretor de Programas Temáticos e Setoriais do órgão.

Ainda que o Brasil tenha acumulado três décadas de experiência e conte com vantagens — a produtividade do etanol brasileiro (74 toneladas por hectare) é superior à média mundial (69 toneladas por hectare) —ganha a corrida do etanol de segunda geração quem primeiro descobrir descobrir a melhor rota tecnológica para transformar resíduo em álcool. Nem o BNDES anunciou ainda linhas de crédito para pesquisa e desenvolvimento na área.

— Se continuarmos de braços cruzados vamos perder a corrida tecnológica. Com ações isoladas e pouca massa crítica, não vamos chegar a lugar nenhum — pontua Luiz Augusto Cortez, vice-coordenador do Grupo Energia Projeto Etanol, do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), do qual fazem parte cerca de 20 instituições brasileiras.

Nos Estados Unidos, seis plantas-piloto já saíram do papel.

O orçamento é de US$ 385 milhões, e a previsão é produzir 863,7 milhões de litros de etanol de celulose. Os projetos estão espalhados pelos estados de Kansas, Flórida, Califórnia, Iowa, Idaho e Georgia.

No Brasil, o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (Cenpes) é o primeiro projeto oficial. A Petrobras investiu R$ 3 milhões para produzir 280 litros de etanol diários, feitos a partir de bagaço de cana. A produção industrial deve começar em 2010.

Os Estados Unidos já identificaram 1,17 bilhão de toneladas de biomassa para etanol de celulose. Até agora nenhum processo é economicamente competitivo. Todo esse esforço científico está sendo liderado pelo Laboratório Nacional de Energia Renovável (NREL, sigla em inglês), no Colorado.

— Temos metas arrojadas a cumprir, e o principal objetivo é reduzir o custo do etanol de milho, que hoje é de US$ 0,52 por litro para US$ 0,34 por litro até 2012 — disse Helena Chum, do NREL, vinculado ao Departamento de Energia dos EUA.

Nascida em São Paulo e morando nos Estados Unidos há 30 anos, Helena Chum foi peçachave nas articulações bilaterais entre o Brasil e os Estados Unidos, que culminaram com o acordo assinado entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e George W. Bush, no começo do ano.

O NREL vem desenvolvendo várias pesquisas aplicadas e a mais adiantada delas, por enquanto, é com a DuPont, que consumiu investimentos de US$ 38 milhões. Outra parceira vem sendo desenvolvida com a espanhola Abengoa, para usar microorganismos no processo de produção do etanol celulósico.

— As petroleiras não gostam muito de etanol, mas estão preocupadas em incorporar conhecimentos na área de biocombustível — admitiu Alan Weimer, que coordenada o Centro de Biorrefinaria e Biocombustíveis (C2B2), da Universidade do Colorado.

Grupo de empresas já tem 40 projetos em análise
Chevron, Dow Chemical, Shell, General Motors, ADM e Novozyme são algumas das 27 empresas que fazem parte do conselho diretor do C2B2, criado há 18 meses. Cada uma delas desembolsou US$ 300 mil anuais e aplicou 10% num fundo de pesquisa compartilhada, que dá direito a ficarem isentas de pagamento de r oyalties em caso de patente reconhecida.

Dos 65 projetos apresentados, 40 deles estão sendo analisados.

Mas não são apenas as grandes companhias que estão se associando às universidades americanas. Na Georgia, a Range Flues é um exemplo típico dessa parceria com empresas recém-criadas. Usando restos de madeira, ela tem a meta de produzir 76 milhões de litros de etanol. Seu dono é o conhecido investidor em fontes de energia renovável, Vinod Khosla, um dos fundadores da Sun Microsystems.

Outros centros de pesquisa dos Estados Unidos também estão se mobilizando, e a concorrência para saber quem vai chegar primeiro nessa corrida tecnológica está acirrada. Os principais adversários da Universidade do Colorado são as universidades de Berkeley, Iowa e Georgetown.

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